Monday, December 02, 2013

A BANDA DO TERROR

Mitologias I
 
A discussão à volta da despesa pública está infestada de mitos. Um deles é a persistentemente proclamada insustentabilidade do sistema de segurança social ameaçando as gerações mais novas com a perda, parcial ou mesmo quase total, do valor das pensões quando chegar a hora de se reformarem. É a banda do terror, para utilizar uma expressão de um director-adjunto do Expresso, publicado esta semana, em arruada. Mas há mais mitos nesta matéria. Conto voltar ao tema, daí o subtítulo do apontamento de hoje.
 
“De acordo com as projecções divulgadas em 2012 pelo grupo de trabalho da Comissão Europeia que acompanha as matérias relacionadas com o impacto do envelhecimento da população na despesa pública, em particular em pensões, estima-se que, no período 2010-2060, Portugal será um dos países onde o risco do aumento do peso da despesa com pensões ameaçar a sustentabilidade do sistema será menor”.  Segundo esse mesmo estudo, o aumento da despesa com pensões durante aquele período de 50 anos será de 0,2%, bem abaixo da média na zona euro (1,9%) e na União Europeia (1,6%) – Relatório do OE 2014 pág. 55   

“Um livro de Pedro Rodrigues e Marvão Pereira, “A Reforma das Pensões em Portugal” de Julho de 2007, mostra-nos um cenário negro. Recomenda-se a leitura para quem é fã em filmes de terror e procurar testar novos limites. Para que ao actual sistema de pensões fosse sustentável era necessário uma poupança permanente, de 2004 em diante de 8,7% do PIB” -  J V Pereira / Expresso/Economia de 30/11/2013-
O jovem J V Pereira não encontrou melhor instrumento para se juntar à banda dos que apregoam o esgotamento do sistema e o fim das pensões do que um livro de uns amigos publicado em 2007, ignorando um relatório da Comissão Europeia de 2010. Porquê, só ele poderá dizer. Não leu sequer o relatório do OE 2014? Não é admissível num director-adjunto do Expresso.

Quando o JV Pereira, que deve ter não menos que 30 anos agora, terá 80 a 90 no fim do período em análise no relatório da Comissão, mas conclui sem olhar para o lado: “Quem entrou há pouco tempo no mercado do trabalho já deve estar a ver que a sua reforma é pouco mais que uma miragem”.  Estará J V Pereira já preocupado com a sua reforma quando chegar 2060? Ou é, no mínimo, irresponsável, quanto a este ponto?

"Cada um o que quer, aprova. O sertão está em toda a parte" - João Guimarães Rosa / Grande Sertão : Veredas

2 comments:

Margarida Corrêa de Aguiar said...

Caro Rui Fonseca
A informação que transcreve da proposta do OE não garante a sustentabilidade do sistema previdencial considerando os planos de benefícios que estão estabelecidos, o modelo de financiamento e a evolução demográfica e económica a médio e longo prazos.
A proposta do OE é aliás contraditória. No Relatório sobre a Sustentabilidade Financeira da Segurança Social - página 215 e seguintes - é afirmado que "regista-se tal como em 2012, uma antecipação da ocorrência do primeiro saldo negativo para o início da década de 20". Veio o governo acrescentar recentemente que sem o aumento da idade de reforma para os 66 anos a ruptura aconteceria em 2015.
Acontece que estamos em plena ruptura com os saldos negativos do sistema previdencial a serem financiados pelos impostos, através de transferências do OE. Uma situação que ocorre desde, pelo menos, 2009, mas de forma assumida em 2012, 2013 e 2014, com défices que ascendem em 2013 e 2014 a, respectivamente, 1.430 milhões de euros e 1.390 milhões euros.
Este assunto está muito mal explicado. O aumento da idade de reforma para os 66 anos não resolve o problema. Faltam explicações políticas sobre este assunto, tecnicamente sabemos perfeitamente que o actual sistema está financeiramente em dificuldades, não sendo previsível que a situaçáo se inverta.

Rui Fonseca said...

Estimada Margarida Corrêa Aguiar,

Grato pelo seu comentário, tomei a liberdade de o tomar como tema adjuvante do meu apontamento de hoje.

Na expectativa de outros contributos que possam corrigir o meu pouco informado conhecimento do assunto, agradeço-lhe antecipadamente desde já.