J. Bradford DeLong*
Manter tanta actividade económica quanto possível sob o controlo do sector privado, para garantir que o que é apresentado é aquilo que os consumidores querem de facto.
Impedir que os reis de Wall Street, que nos levaram à crise, tenham benefícios com o risco sistémico que criaram.
Garantir que aqueles que possuem habitação própria e os pequenos investidores não tenham demasiado prejuízo pelo único "crime" que cometeram, o de aceitar correr sérios riscos, coisa que não teriam feito num universo de carteiras adequadamente diversificadas.
Agora é óbvio que a Fed e o Tesouro perderam a partida. Se há que evitar uma depressão, isso terá de ser trabalho de outras autoridades governamentais, com outros instrumentos e com outros poderes. Eu penso que vai acabar por se verificar que o fracasso em conter a crise se deve a uma preocupação excessiva com os dois objectivos secundários: controlar os senhores de Wall Street e dar ao sector privado a tomada de decisões. Se a Fed e o Tesouro tivessem dado a esses dois objectivos a importância - secundária - devida, duvido que estivéssemos agora nesta confusão, e creio que o perigo de uma depressão global seria ainda longínquo. O desejo de evitar que os grandes senhores da Wall Street lucrassem com a crise reflectiu-se na decisão da Fed-Tesouro de deixar a Lehman Brothers ir-se abaixo numa bancarrota descontrolada sem fiscalização, supervisão, ou garantias. A lógica por detrás dessa decisão foi que, no início da crise, os accionistas tinham sido severamente punidos quando as suas empresas foram consideradas demasiado grandes para falir. Os accionistas da Bear Stearns, AIG, Fannie Mae, e Freddie Mac tinham essencialmente participações e toda a sua riqueza confiscada. Mas isto não se passava com os detentores de obrigações e contrapartidas, a quem se pagou na totalidade. A Fed e o Tesouro receavam que a lição que estava a ser ensinada na segunda metade de 2007 e na primeira de 2008 fosse que o governo norte-americano assegurava toda a dívida e transacções de todos os bancos e entidades bancárias que fossem considerados demasiado grandes para falir. Isso, achavam a Fed e o Tesouro, não era saudável. Aqueles que emprestavam às instituições muito grandes e sobrealavancadas tinham de ter algum incentivo para avaliar os riscos. Mas isso exigia que, numa qualquer altura, se permitisse que um qualquer banco falisse, e que se persuadisse algum detentor de obrigações e contrapartidas a que a garantia de apoio por parte do governo a instituições demasiado grandes para falir não era certa. Em retrospectiva, foi um erro tremendo. A vasta teia das finanças tal como existia no Verão de 2008 era o resultado de milhões de cálculos que o governo norte-americano, na realidade, suportava a dívida sem garantias de todos os bancos e entidades bancárias muito grandes. Quebrada essa garantia com a falência da Lehman Brothers, todas as instituições financeiras procuraram de imediato adquirir um apoio de capital para evitar a necessidade de ajuda apoio governamental, mas depararam-se com a impossibilidade de o fazer. A insolvência da Lehman Brothers gerou uma extraordinária e imediata procura de capitais que o sector privado não conseguia suprir. Foi nesta altura que o Tesouro cometeu o segundo erro. Como tentou manter privado o sector privado, procurou evitar a nacionalização parcial ou total dos componentes do sistema bancário considerados demasiado grandes para falir. Olhando para trás, o Tesouro devia ter identificado todas essas entidades e começado a comprar acções ordinárias - quer isso lhes agradasse ou não - até a crise passar. Sim, isto é aquilo a que se poderia chamar "lemon socialism," (proteccionismo) criando graves perigos ao controlo de empresas, colocando uma ameaça de corrupção em larga escala, e criando precedentes para uma intervenção que poderia vir a revelar-se muitíssimo perigosa no futuro. Mas teria isso sido pior do que o que enfrentamos neste momento? O não santificar o objectivo secundário de manter privado o sector privado implicou que a Fed e o Tesouro perdessem a oportunidade de atingir o objectivo principal de evitar uma depressão. Claro que a retrospecção é sempre fácil. Mas se é preciso evitar a depressão, terá de ser usando as velhas políticas fiscais keynesianas: o governo vai ter de intervir no aumento da despesa e decidir quais os produtos e serviços em procura.
* J. Bradford DeLong é professor de Economia na Universidade de Berkeley e foi secretário de Estado Adjunto do Tesouro norte-americano. Exclusivo PÚBLICO/Project Syndicate
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