A notícia corria mundo e coloquei aqui um apontamento sobre o assunto pouco convencido que ele tivesse a relevância correspondente ao bruaá que tinha levantado: Carmen Reinhart e Kenneth Rogoff tinham concluído num paper de 2010 - "Growth in a Time of Debt" - que um nível de endividamento público superior a 90% do PIB determinava um decréscimo do crescimento económico. Numa altura em que a discussão acerca dos malefícios da dívida estava no auge, o trabalho dos professores de Harvard era arvorado pelos defensores da austeridade como a terapia adequada à criação de condições necessárias à recuperação económica. Mas, afinal, o documento continha erros e omissões que comprometiam a solidez das suas conclusões. De um momento para o outro só não ruíram as convicções dos próceres da austeridade custe-o-que-custar porque a fé é mais inabalável que a ciência.
E, apesar da confirmação pelos autores dos erros observados, a política de austeridade não cedeu um milímetro por causa da alegada inconsistência dos resultados do celebrado paper. Hoje, - vd aqui - ficámos a saber que a Carmen e o Kenneth corrigiram o documento mas mantêm as conclusões, i.e., endividamento acima de 90% do PIB, quod est demonstratum, reduz o crescimento económico. Note-se, contudo, que os dois economistas não afirmam agora nem afirmaram antes que a saída de uma fase económica recessiva passe pela austeridade, i.e., pela redução forçada do endividamento. O que eles afirmam é que, analisadas séries muito longas significativas de crescimento e endividamento, a tendência vai no sentido que eles referem: dívida pública acima de 90% do PIB determina perda de crescimento económico.
A conclusão só é surpreendente pelo nível de 90% de referência calculado. Um dos critérios de Convergência de Maastricht impõe aos países membros a adopção de políticas que façam convergir a sua dívida pública para 60% do PIB, uma meta que fica muito além dos benevolentes 90% descobertos pela Carmen e pelo Kenneth. Fica é muito aquém dos níveis atingidos nos países fragilizados, e nomeadamente em Portugal onde já terá atingido os 126%.
O ministro das finanças Vítor Gaspar afirmava há dias que Portugal levará 25 anos a atingir o nível comprometido em Maastricht. No fim de contas, as contas de Reinhart e Rogoff são um lenitivo para a nossa desesperança.
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