Wednesday, February 18, 2009

IBM

"The benefits of globalisation had not been widely or fairly shared and the backlash was already there"

Há dias, a propósito do convite da IBM a colaboradores seus em operações a deslocalizar, para acompanharem a deslocalização, com redução dos vencimentos para os níveis observados nos locais para onde as operações se deslocalizam, escrevi aqui que a imposição administrativa de níveis salariais implicará restrições à imigração e a manutenção de salários elevados, determinando perdas de competitividade. O caso da IBM era inverso mas as causas e as consequências as mesmas.

Não tenho qualquer informação acerca do resultado da proposta da IBM que, apreciada de uma perspectiva moral, é indecente. Já do ponto de vista económico o caso muda de figura.

A globalizaçação não é um fenómeno recente, apenas se exarcerbou nas últimas décadas. É irreversível? Não é. Aumentou as desigualdades sociais? Aumentou nuns casos, reduziu em muitos outros.
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Ninguém duvida que a globalização pode recuar e que o proteccionismo não venha a ser invocado por muitos como forma de resolver a crise do sistema. Mas a mensagem "buy american" e outras de índole semelhante, se têm alguma razão de ser em alguns casos, podem provocar uma crise global ainda maior se delas resultarem acções de retaliação proteccionista em cadeia. Se isso ocorrer, a seguir à guerra comercial seguir-se-á, muito provavelmente, uma guerra sem vencedores porque dela só sairão vencidos. Por trás da criação da CECA, Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, em 1951, no rescaldo do fim da Segunda Guerra Mundial estava a intenção de evitar a repetição de um novo conflito armado em larga escala na Europa. A CEE que se lhe seguiu, e a actual União Europeia, têm como pilares fundadores a promoção económica e social como forma de sustentação da paz entre os europeus. A mesma ideia, de que o comércio livre promove o relacionamento pacífico entre os povos e o proteccionismo a guerra, aplica-se ao mundo actual, cada vez mais pequeno em consequência de todas as inovações tecnológicas que reduziram as distâncias.
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Seria, portanto, muito perigoso que os avanços observados no sentido do desmantelamento das fronteiras alfandegárias viessem a retroceder significativamente em consequência da actual crise. O que não invalida que alguns princípios não devam ser estabelecidos no sentido de evitar algumas consequências perversas de um liberalismo sem regras.
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Voltando ao caso da IBM, que não é um caso singular, se alguma singularidade existe ela estará no facto de o convite à deslocalização parecer ter sido feito a todos os seus colaboradores nas operações a deslocalizar, e não apenas a um número reduzido deles, a sua análise, ainda que muito breve, permite situar-nos no âmbito das consequências da globalização. Não conheço o caso em pormenor, guio-me apenas pelo que pode ler-se na notícia.
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A deslocalização de actividades económicas, que começou por atingir sobretudo as indústrias transformadoras mas que hoje abrange já muitos serviços, é uma consequência indiscutível do comércio livre. Sem barreiras alfandegárias, a concorrência estabelece-se entre os vários factores produtivos, o mais relevante dos quais é o trabalho.
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A IBM, que nos começos da era informática foi a grande senhora do sector, deixou há muito de deter a exclusividade do know-how e a liderança da inovação. Passou a ter de competir de igual para igual com muitos outros concorrentes, alguns dos quais se localizaram em países onde o trabalho é remunerado com salários muito mais baixos do que naqueles onde a IBM começou por instalar as suas operações. À IBM, para se manter competitiva, não resta alternativa senão deslocalizar-se. A menos que medidas proteccionistas lhe garantam mercados a preços mais elevados, que permitirão manter salários mais elevados do que aqueles que pagam os seus concorrentes.
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Sendo indecente do ponto de vista moral, se nos colocarmos no lugar daqueles que de um dia para o outro são convidados a sair do local onde trabalhavam, para o desemprego ou para um país distante, a proposta feita pela IBM tem fundamento económico num mundo onde o comércio livre é tido como motor do desenvolvimento global e da promoção da paz entre os povos.
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O cálculo que aponta para um aumento de 50 milhões de desempregados em todo o mundo em consequência desta crise pode atribuir algumas culpas á globalização na medida em que esta, ao promover a concorrência global, promove a redução do número de trabalhadores necessários à execução de um dado trabalho. Mas, por outro lado, a globalização, ao promover a produção de novos bens e novos serviços, aumenta o emprego; criando mais empregos nos países onde o trabalho é pior remunerado, cria novos consumidores dos produtos e serviços produzidos onde o trabalho é melhor remunerado. O recuo na globalização conduzir-nos-ia às sociedades de economia de subsistência.
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Subsiste, reconheça-mo-lo, pelo menos mais uma questão: Precisamos mesmo de novos bens e novos serviços?
Para que preciso eu deste computador em que componho este post?
Para que preciso deste post?
Para que preciso deste blog?

3 comments:

A Chata said...

Sem considerações morais ou de opções empresariais, acha mesmo que a proposta da IBM tem aplicação prática?

Talvez num ou noutro caso especifico (pessoal indiano que está a trabalhar na IBM nos EUA) mas, para a generalidade dos trabalhadores americanos ou canadianos, mudar para países com culturas completamente diferentes, concorrer com o excesso de mão de obra desses países, e passar a ter um rendimento que não lhes permitirá facilmente visitar o país de origem não me parece uma proposta minimamente aceitável.

Aprender mandarim é uma coisa complicada...

Proteccionismo?
Como?
Para proteger é necessário que haja alguma coisa a protejer.

'Buy american'
O que é que realmente made in America nos dias que correm?
Os carros?
Estão na falência ou quase.
Os produtos farmaceuticos?
São feitos na India.
O aço e produtos para construção?
Leia a 'guerra' da Chinalco com a Rio Tinto e veja quem dá as cartas.
A sensação que tenho é que a Europa e os EUA viveram estas últimas decadas dos serviços financeiros que além de terem produzido mega fraudes, incentivaram um endividamento geral monstruoso.

E o endividamento continua.
Os países continuam a endividar-se.
O dinheiro vem de onde?
Das reservas que grande parte dos países não tem?
Das impressoras dos bancos centrais. Até quando?

Não consigo entender estas medidas para combater a crise, como se fosse passageira e para logo, logo, voltarmos à mesma orgia financeira dos últimos anos.

Consumam mais! Financiem-se empresas condenadas para manter uns milhares de emprego mais uns meses!
Mais dinheiro para as instituições financeiras para continuarem a fazer o mesmo que nos levou a esta situação!
Não é possivel!

A guerra paira sobre as nossas cabeças, temo.
Já se começam a escolher parceiros...

Iran pins Hope on Military Alliance with Russia and SCO

Global Research, February 17, 2009
Ria Novosti

MOSCOW, February 16 (RIA Novosti) - Iran expects to receive the backing of Russia, which holds the presidency of the Shanghai Cooperation Organization, in its bid for full membership of the organization, Iran's foreign minister said on Monday.

The SCO comprises Russia, China, Kazakhstan, Tajikistan, Kyrgyzstan, and Uzbekistan. Russia took over the presidency of the organization last August. Iran and Pakistan have observer status within the organization.
"Iran has officially addressed SCO members and expects its observer status to be finally upgraded to full membership during Russia's chairmanship period," Manouchehr Mottaki said in an interview with RIA Novosti.

Widely seen as a counterweight to NATO's influence in Eurasia, the group primarily addresses security issues, but has recently moved to embrace economic and energy projects.
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http://globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=12329

Russia, Turkey declare new era with ‘strategic’ document
Global Research, February 14, 2009
Today`s Zaman

The presidents of Russia and Turkey signed a joint declaration in Moscow yesterday aimed at deepening friendly relations and improving multidimensional cooperation between the two countries, with the Russian side defining the declaration as a “strategic document.”
"Turkey and Russia are doing much for the maintenance of security in the Black Sea region and the Caucasus in general. We count on strategic cooperation with Turkey in that sphere. I think both our countries are interested in it. We hope such coordination will be maintained," Medvedev said. "I am sure the visit to Russia will become a turning point for bringing our relations to a new, higher level," Gül said.
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http://globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=12306

Rui Fonseca said...

"acha mesmo que a proposta da IBM tem aplicação prática?"

Se por aplicação prática se refere à probabilidade de aceitação dos trabalhadores se deslocalizarem, penso que essa probabilidade é baixíssima.

Por isso a proposta é cínica.

Há casos de deslocalização de quadros superiores ou médios com condições atractivas para os deslocados. Nas condições propostas pela IBM não conheço. Por isso me parece indecente.

Já quanto à deslocalização em si, uns lamentar-se-ão, outros regozijar-se-ão.


"O que é que realmente made in America nos dias que correm?"

Muita coisa e, sobretudo, a capacidade técnica de produzirem muita coisa e um mercado que pode ser autosuficiente.

Do meu ponto de vista o comércio livre, apesar dos entorses conhecidos, tem beneficiado mais os países em vias de desenvolvimento que os EUA. Em termos puramente económicos, entenda-se, os EUA serão globalmente perdedores. Por outro lado, contudo, o comércio livre tem retirado da miséria muitos milhões de seres humanos.

E com a redução da pobreza no mundo ganhamos todos, ainda que alguns possam perder alguma coisa e outros ganharem mais do que deviam.

A Chata said...

"Muita coisa e, sobretudo, a capacidade técnica de produzirem muita coisa e um mercado que pode ser autosuficiente."

Produzir o quê, concretamente?

Grande parte das estruturas produtivas fecharam e continuam a fechar.
A capacidade técnica foi deslocada com os empregos ou está no desemprego.

O homem da Microsoft disse recentemente que os engenheiros chineses, formados nas universidades chineses, estão mais bem preparados que os engenheiros chineses que se formaram em universidades americanas ou inglesas.

Um mercado que pode ser autosuficiente se produzisse o necessário para o fazer.

Podemos dizer isso da China, que produz quase tudo o que se consome no Mundo e tem uma população de 1 bilião e tal mas, dos EUA ou da Europa já é outra conversa.

"Por outro lado, contudo, o comércio livre tem retirado da miséria muitos milhões de seres humanos. "

Estamos a falar dos milhões (sobretudo chineses) que passaram do rendimento 1 dollar/dia para 1,25 dollar/dia?

"The U.S. itself also has the largest gap and inequality between rich and poor compared to all the other industrialized nations. For example, the top 1% receives more money than the bottom 40% and the gap is the widest in 70 years. Furthermore, in the last 20 years while the share of income going to the top 1% has increased, it has decreased for the poorest 40%."

"The gap between rich and poor has grown in more than three-quarters of rich countries since the mid-1980s, according to a study of income inequality and poverty by the Organization for Economic and Cooperative Development (OECD) released in October 2008.
In addition, the study finds that the economic growth of recent decades has benefited the rich more than the poor."
However, amongst those 30 countries, results are mixed. The study finds, for example, that the past five years saw growing poverty and inequality in two-thirds of OECD countries. Canada, Germany, Norway and the United States are the most affected. The remaining third—particularly Greece, Mexico and the United Kingdom—have seen a shrinking gap between rich and poor since 2000.
As summarized by an OECD briefing , the income of the richest 10% of people is, on average across OECD countries, nearly nine times that of the poorest 10%.
The average hides large variations. For example the top 3 countries with the highest income gaps are:
1.Mexico, where the richest have incomes of more than 25 times those of the poorest

2.Turkey, where the ratio is 17 to 1

3.USA, where the ratio is 16 to 1

Portugal and Poland also have large gaps, making it the top 5, but their gaps are not as large as those first three. (For many years, the US was regarded as having the largest gap between rich and poor of any industrialized nations, but the group of industrialized nations has slightly grown since to include Mexico and Turkey—also the two poorest OECD countries—amongst others.)."


"Summarizing from the works of the Institute for Economic Democracy:

•The old European city states, which were centers of wealth, would control their countryside as the source of their resources and production, and hence, the source of their wealth. If the countryside became more efficient and produced better, or threatened to trade with other neighboring cities, this would be seen as a threat to the wealth, power and influence of the city. These peripheries would therefore be raided and their means of production would be destroyed.

•The cities would fight over each other for similar reasons.

•For continual support, those rulers would proclaim various reasons to their people, of maintaining security and so on (not unlike what we hear today about national security). Even some laws were established that basically allow these practices.

•A strong military was therefore necessary (just as it is today) to ensure those trade advantages were unfairly maintained.

•Those European city states evolved into nation states and imperial powers, and the countryside expanded to include today’s “third world”, which was much of the rest of the world. The discovery of the Americas, expansion of trade routes etc brought much wealth to these “centers of empire” which helped fuel the industrial revolution, which required even more resources and wealth to be appropriated, to continue this growth. Mass “luxury” consumption in Europe expanded as well as a result of the increased production from the industrial revolution. But this had a further negative impact on the colonized nations, the “country side”, or the resource-providers. (See the behind consumption and consumerism section on this site, for more about how this impacted much of the world in different ways as mass consumerism also resulted from the industrial revolution.)

•As with the previous wars throughout Europe’s rise, World War I and II were also battles amongst the various European empires who struggled over each other to control more of the world’s resources and who would “decide the rules of unequal trade”.
Except for religious conflicts and the petty wars of feudal lords, wars are primarily fought over resources and trade. President Woodrow Wilson recognized that this was the cause of World War I: “Is there any man, is there any woman, let me say any child here that does not know that the seed of war in the modern world is industrial and commercial rivalry?”
— J.W. Smith, Economic Democracy: The Political Struggle for the Twenty-First Century, (M.E. Sharpe, 2000, 1st Edition), p.58"


http://www.globalissues.org/article/4/poverty-around-the-world#globalissues-org

Com globalização ou sem ela (o que não acredito que possa vir a acontecer) o que realmente se alterou foi a balança do poder e resta saber como vão reagir as potências que sairam a perder.

Não é nada de novo na História da Humanidade, a diferença é o número de individuos envolvidos, porque como dizia Tucídides, a natureza humana não se altera.