Saturday, February 18, 2012

O JUSTIÇÓMETRO

Há dias, a propósito da condenação de Baltazar Gazón, dois posts colocados aqui e aqui suscitaram dezenas de comentários que, fundamentalmente, defendiam uns a decisão dos juízes que condenaram Garzón, pela utilização, tida por  ilegal, de provas (conversas de arguidos com os seus advogados), sustentando que aos juízes compete a estrita execução das determinações das leis, contrapondo outros que a interpretação das leis, de quaisquer leis, não é nem nunca foi cega, como pretende a imagem com que geralmente a representam. As leis são as que as forças predominantes pretendem que sejam, os juízes decidem em função da interpretação que delas fazem, e, não raras vezes, de factores externos que os condicionam. Se assim não fosse não teríamos, como dizia o outro, justiças a mais, porque temos, pelo menos duas: uma para os pobres, outra para os ricos.

Para além disso, pode qualquer lei condicionar a procura da verdade, a condição sem a qual a justiça não é possível, se essa procura não for realizada por meios que atentem contra a integridade física ou psicológica da pessoa humana? Que razão maior se pode sobrepor à procura da verdade para além do respeito pela condição humana?

E que justiçómetro pode evitar que inimputabilidade dos juízes fira os mais sensíveis sentimentos do povo em nome do qual os juizes têm a incumbência de julgar? Compreendo que a abundância de exemplos patológicos seja tanta que os profissionais do direito para os quais a ética da sua profissão é um valor inviolável se sintam incomodados com eles mas, que apesar disso, continuam intransigentes na defesa dos princípios em que acreditam.   

Mas não sei como podem justificar, sustentados nessas traves mestras do direito, sentenças como aquelas que os jornais de ontem noticiaram: Supremo condenou psiquiatra a pagar 100 mil euros por abuso sexual a paciente grávida, depois das Varas Criminais do Porto terem condenado o psiquiatra a cinco anos de prisão (pena suspensa) e a 30 mil euros de indemnização à vítima, e a Relação o ter absolvido "por não ter havido violência suficiente", e impedindo o recurso à vítima da parte criminal.

Que facto novo ocorreu entre a sentença em primeira instância, a absolvição pela Relação e a condenação na parte cível pelo Supremo, senão a ocorrência de factores exteriores em que, neste caso, suponho eu, preponderaram os juízos populares?

Insisto: A justiça não pode ser popular mas também não pode ser impopular. A condenação de Garzón obedeceu primordialmente aos ditames de princípios que nem são justos nem são populares pela simples razão que preterem a procura da verdade com que se realiza a justiça à calcificação do direito.

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