Há dias o prof. Freitas do Amaral, catedrático de Direito, defendia o voto obrigatório como forma de evitar a abstenção e motivar os jovens a participar na vida cívica e política portuguesa. Anteontem, o catedrático de Direito prof. Marcelo aderiu à proposta do prof. F Amaral. A adesão do prof. Marcelo foi feita na sequência de uma avaliação que fez a partir de declarações que terá ouvido junto de colegas da faculdade, de alunos, de amigos e conhecidos, e que o terão levado a concluir que "se o tempo estiver bom no dia das eleições serão muitos os que vão até à praia".
A mim, não me admira que essa seja, efectivamente, a decisão de uma larga maioria nas próximas eleições, e não só das europeias no mês que vem mas também das legislativas no próximo ano. O contrário é que seria de admirar. A proposta dos catedráticos é uma rotunda tolice a vários títulos, de que destaco três.
Porque a obrigatoriedade de voto seria uma medida antidemocrática na medida em que sendo o voto uma opção cívica de cada eleitor o seu não exercício é um direito que não lhe pode ser retirado. Aliás, a obrigatoriedade de voto é, geralmente, imposta em países onde a pretensa democracia não passa de um arremedo dela. Mas, para além da tirania que estaria subjacente na obrigatoriedade de exercício de um direito que tem de ser livre, para ser sério, o voto em branco ou nulo acabaria por frustar a aquela intenção tola.
Por outro lado, nem uma forte participação eleitoral é sintoma de amadurecimento democrático, nem os níveis de abstenção alteram substancialmente os resultados, uma vez que aqueles que se abstêm se fossem obrigados a votar, ou votariam em branco, ou anulariam o voto, ou votariam replicando a tendência do voto dos não coagidos a votar. Esta conclusão é fácil de comprovar considerando que as sondagens feitas às intenções de voto prevêm resultados muito próximos dos reais a partir de amostras relativamente muito reduzidas.
Quanto a motivações dos jovens de participar na vida cívica e política portuguesa, sabem bem os senhores catedráticos das razões pelas quais os jovens, e não só os jovens se alheiam da participação cívica. Eles sabem, ou têm obrigação de saber, que a política é dominada pelo compadrio, pela conivência nas conveniências, pelo incumprimento da lei, pela corrupção, pela mentira. É isso, é esse fedor da putrefacção da democracia, que afasta os eleitores das mesas de voto.
Só uma concepção totalitária da vida em sociedade se pode atrever a restringir-nos o direito ao ar do mar.
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4 comments:
"...é esse fedor da putrefacção da democracia, que afasta os eleitores das mesas de voto."
Então, nada a fazer. Estamos irremediavelmente perdidos! Nem sequer tentamos lutar pela limpeza da putrefacção. Vamos para a praia onde o ar é mais limpo. Arredamo-nos da cidadania pois é uma impostura, e aguardamos que, por um golpe de sorte, surjam pessoas de bem no espectro político que nos couber em sorte...
Podemos e devemos lutar pela
Iimpeza!
Mas o voto obrigatório não limpa, quanto muito encobre a sujidade.
Permita-me a adenda;
Faz muita falta a educação cívica,para a cidadania ou o que lhe queiram chamar. Muito boa gente tem tudo como direitos adquiridos e imutáveis. Sabemos que não é assim.
Cumprimentos.
Posso concluir, Jonas River, que no seu entender ao meu direito de não votar se deve sobrepor o direito de me obrigarem a votar?
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