Friday, April 18, 2014

FLAGELAÇÃO DOS INOCENTES

(cont. de aqui)

Em síntese, o imeil diz aquilo que é conversa trivial e merece registo apenas por isso, por estar tão pegado à pele que já faz parte do corpo, e porque que lembra os rituais de sexta-feira santa em sociedades com mais remela nos olhos: "Que o português (retratado à la minute como oportunista, admirador de patifes, inculto, incumpridor, incivilizado) reclama sempre contra os governantes que tem, que teve, e, certamente, criticará os que terá, esquecendo-se que quem votou nos políticos foi ele, o povo que temos".  Uma afirmação falaciosa que se tornou convicção generalizada.

Falaciosa, porque, não sendo o retrato feito uma completa desfiguração da realidade - quem é que pode negar que por troca de duas transgressões à ética ou à lei a generalidade dos portugueses fecha os olhos a outra feita à sua frente? E quem pode contestar que a falta de pontualidade e o incumprimento de compromissos é mais regra que excepção? - são pecadilhos as transgressões cometidas na base quando comparadas com as fraudes, as burlas e os roubos, o compadrio, a desfaçatez, a falta de vergonha em larguíssima escala tão corrente entre muitos dos que ocupam os estratos cimeiros da pirâmide social*. 

Falaciosa ainda,  porque levando à conta de pecado maior o exercício do único direito que nos iguala a todos - o direito de votar, ou não votar - desvia a atenção dos que frequentemente subvertem os compromissos feitos, enquanto candidatos, uma vez eleitos.

Como nas procissões medievais de sexta-feira santa, autoflagelam-se os penitentes anónimos de meia tijela para desconto dos pecados gordos das hierarquias.

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 * O mal é geral. Aqui, mais um exemplo, conhecido hoje.


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