Saturday, January 19, 2008

DARWIN E O VARA

Há muita gente que vê nos políticos carreiras de oportunismo e vulgaridade. Os políticos são, não raras vezes, conotados como inábeis que, incapazes de fazer qualquer coisa útil na vida, se penduram nos partidos e ali vão tecendo o casulo onde lhes crescerão as asas de lepidópteros que nos traçam (na duplicidade dos sentidos do termo) o tecido social. Se são incensados por devotos e apoiados por admiradores transitórios, a apreciação que geralmente recolhem da opinião pública é negativa.
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Há, evidentemente, nesta atitude frequentemente de crítica demolidora da actividade política muitas vezes razões que extravasam da responsabilidade daqueles que foram eleitos para a gestão da coisa pública mas que encontram neles os bodes expiatórios de todos os insucessos colectivos e, muitas vezes mesmo, de frustações individuais. De tudo o que não se possa responsabilizar terceiros, responsabilizam-se os políticos.

A ideia de que a política é a mais nobre das actividades humanas é acalentada pelos eleitos mas raramente pelos eleitores: as sondagens à opinião pública posicionam, quase sempre, os políticos em lugares do fim dos rankings de um conjunto de profissionais liberais (juízes, professores, médicos, militares, por exemplo) quanto a atributos de idoneidade, competência, honestidade, entre outros.
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Tem muita razão José Miguel Júdice, quando afirma em artigo publicado ontem no Público, "DARWIN E O BCP" - Marcar com um ferrete os que passam pelos partidos é injusto e, mais do que isso, é inconveniente", a propósito da controvérsia levantada pela eleição de Armando Vara para a vice-presidência do BCP.
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Acha JMJ que "o combate político é uma forma por excelência de selecção dos mais aptos, visto que o subsistema político é o mais competitivo que se conhece. Todas as características que definem - para o bem e para o mal - os gestores de alta direcção empresarial se encontram no mundo político" para concluir que, se Santos Ferreira escolheu Vara para seu vice-presidente, sendo Santos Ferreira reconhecidamente competente, e tendo a eleição da administração executiva do BCP sido eleita por 97% do capital presente na assembleia de accionistas, Armanda Vara é inequivocamente competente para o lugar.
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A argumentação de JMJ sustentada na tese de que a competição selecciona os mais aptos e que, sendo o subsistema político o mais competitivo, os políticos são, por essa razão, sempre capazes, porventura até os mais capazes, confronta-se mal com a generalidade da opinião pública acerca dos mesmos políticos, que os considera ineptos e muitas vezes corruptos.
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Contudo, se quisermos chamar Darwin para apreciar esta flagrante diferença de perspectivas, a justificação que JMJ parece (ou quer) ignorar e a opinião pública frequentemente radicaliza é simples: a selecção das espécies não favorece os mais capazes, os mais inteligentes ou os mais fortes mas os que melhor se adaptam ao meio onde vivem. O que, obviamente, não faz, necessariamente, de um político, mesmo bem sucedido, um gestor minimamente capaz, pela elementar razão de terem de actuar em meios completamente diferentes.
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Aliás, os mundos da política e dos negócios oferecem-nos exemplos inequívocos. Há políticos que fracassaram redondamente no mundo dos negócios, antes ou depois de terem transitado pelo mundo da política, e a maior parte dos gestores ou empresários bem sucedidos nunca se tentaram pela gestão da coisa pública.
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O que JMJ esqueceu (propositadamente ou não) foi dos interesses de que se aproveitam os empresários quando os políticos, ou ex-políticos, estão posicionados para lhes garantirem vantagens, distribuindo entre eles, empresários e políticos, os resultados do acasalamento
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A evidência deste esquecimento propositado é clara: JMJ sabe muito bem que A. Vara solicitou uma licença sem vencimento à CGD para o período em que se encontrar na administração do BCP. JMJ sabe bem o que isso significa: No dia em que se alterarem as correlações de forças no BCP ou no Governo, a aptidão de Vara não se segura sem uma posição garantida de recuo. Quando se alterar o meio, Vara adaptar-se-á com outra forma ou cor.
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José Miguel Júdice também.

2 comments:

António said...

Boa!
Você está como o Vinho do Porto.
Rica pinga!

Rui Fonseca said...

Obrigado, António.

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