O Relatório da Comissão Europeia Anti-Corrupção divulgado hoje, com resultados graficamente resumidos a pags. 25 da versão em inglês (não consegui localizar a edição em português, se existe) e destacam-se algumas conclusões curiosas, ainda que delas não ressalte nada de novo relativamente ao que já se sabe: o campo está muito mais minado a sul que a norte. E, no entanto, ainda que repetitivas, as conclusões não deixam de causar alguma repetida perplexidade. Por exemplo, "a esmagadora maioria dos portugueses (90%) é da opinião que a corrupção é generalizada no país, mas menos de 1% dos inquiridos reconhece ter-lhes sido alguma vez solicitado um suborno."
Para o conjunto dos membros da União, três em cada quatro europeus estão convencidos que a corrupção é generalizada, uma média bastante influenciada pelas respostas dos países do sul e do leste - Grécia (99%), Itália (97%), Lituânia, Espanha e República Checa (95%), Croácia (94%) Roménia (93%) Eslovénia (91%), Portugal e Eslováquia (90%). No lado oposto situam-se os países nórdicos, onde a corrupção é considerada uma prática rara para 75% dos dinamarqueses, 64% dos finlandeses e 54% dos suecos.
Se, segundo os resultados, a menos de 1% dos portugueses inquiridos alguma vez lhe foi solicitado um suborno (o inquérito realizou-se apenas no âmbito da esfera pública) como é que a percepção de corrupção generalizada é admitida por 90%? Só pode haver uma explicação: não decorrendo a percepção de corrupção do acontecimento generalizado de actos ou tentativas de corrupção, a qualificação de "corrupção generalizada" provém certamente das notícias de muitos casos de alta corrupção, envolvendo figuras públicas, geralmente não sancionados ou, mais geralmente ainda, nem sequer julgados pela justiça.
A generalização de culpas redunda sempre numa banalização de que se aproveitam os verdadeiros culpados. Neste caso, os corruptos. Há corrupção em Portugal? Há, quem pode ter dúvidas? Mas é generalizada, no sentido de que o cidadão comum se confronta frequentemente com a alternativa de pagar ou não ser atendido regularmente pela função pública? Generalizadamente, não é, segundo os resultados.
2 comments:
Não se espante.
Lembro-me de ler um International Crime Victimisation (ou Victims?) Survey de 2005, penso eu, em que, com excepção de furtos em automóveis, Portugal tinha em todos os items níveis de crime inferiores à média, segundo as repostas à pergunta "Foi alvo pessoalmente, ou alguém do seu agregado familiar, do crime tal nos últimos 12 meses?". Depois havia uma pergunta do género "Sente-se seguro a caminhar à noite na sua rua?" e a resposta dos portugueses era muitíssimo mais negativa do que, por exemplo, a dos suecos, que eram alvo de muitíssimo mais agressões nesse contexto.
Somos assim.
Há ainda outro exemplo engraçado, que é o número de anos de vida saudável. Fazia-me espécie que em Portugal houvesse uma diferença tão grande entre a esperança de vida e este indicador (sobretudo no caso das mulheres) até que percebi que os tais anos de vida saudável resultavam da resposta à pergunta "Está de boa saúde?". Só quem nunca ouviu um português (e mais ainda, uma portuguesa!) responder "Vai-se andando..." é que se lembra de levar a sério uma estatística destas!
IsabelPS
Bem observado, IsabelPS.
Obrigado pelo seu contributo.
Volte sempre!
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