Os portugueses desperdiçam um milhão de toneladas de alimentos por ano, equivalente a cerca de 17% do consumo. Menos que a média europeia, vá lá, desta vez não somos dos piores. Mas mesmo assim não deixa de ser uma notícia chocante quando confrontada com as que, quase diariamente, nos relatam situações de tanta gente próxima de nós a sobreviver faminta. Fisicamente mais distantes, mas a entrar-nos em casa pela televisão, as imagens de populações, sobretudo em África, a morrer à míngua, só não nos esmagam porque a sua banalização criou na humanidade uma carapaça de indiferença quase absoluta que só momentaneamente é atravessada por um incómodo transitório.
Leio esta notícia e ocorre-me, obviamente, aquilo que é muito comum nos EUA, um país onde o produto per capita é superior ao dobro do dos portugueses: levarem as pessoas para casa o resto do que sobra das refeições tomadas em restaurantes. Não sei qual é a percentagem de alimentos desperdiçados pelos norte-americanos, mas imagino que nos caixotes de lixo dos restaurantes que frequentam a percentagem de sobras seja mínima. E, conclusão minha, não me parece que quem leve do restaurante o que lhe sobra no prato não tenha a em casa preocupação idêntica.
Outra comparação que me ocorre, a este propósito, é a quantidade de compras com que os portugueses carregam os carros nos supermercados. Tanto nos EUA como na Suíça, outro país com um nível de vida médio mais que duplamente superior ao nosso, os carros das compras raramente passam nas caixas com os volumes de carga que se observam nos supermercados em Portugal. Compram menos que nós? Não é possível. Compram mais frequentemente, de acordo com os consumos semanais. Os portugueses habituaram-se a comprar por atacado, e os supermercados persistem, apesar da crise ou por causa dela, em incutir nos consumidores, através de promoções constantes, o frenezim da compra. Resultado: quando o stock excede as necessidades normais de consumo para um determinado período, ou há sobre consumo ou deterioração de alguns artigos, ou uma coisa e outra.
O serviço público que pagamos à RTP deveria ocupar-se disto, mas à administração da RTP (ou aos governos?) preocupa-a mais entreter o pagode com coisas pseudo cómicas como o "Preço Certo".
1 comment:
Não, mesmo antes de verificar os números eu tinha a certeza de que o desperdício alimentar nos Estados Unidos era incomparavelmente maior do que em Portugal onde "deitar comida fora" ainda é uma espécie de pecado para muitos adultos (noção que já se perdeu totalmente em sociedades de abundância há mais do que uma geração). Uma busca sumária dá cerca de 40% de desperdício alimentar nos EUA. Palpita-me que os doggy bags vêm mais da ideia "paguei, é meu" do que duma qualquer preocupação com o desperdício.
IsabelPS
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