Tuesday, February 04, 2014

DUX VETERANORUM

Vi-o ontem no programa da Fátima Campos Ferreira, que convida os portugueses a estarem acordados às segundas-feiras até à uma da manhã. Tem 42 anos e matricula-se na Universidade de Coimbra há 24. Disse trabalhar há vinte, não especificou em que ocupação mas a moderadora do programa também não lhe perguntou. Por que é que ainda não acabou o curso? Porque é muito difícil, diz ele, ser trabalhador-estudante em Portugal. Se é! No caso dele, sabe-se que não estuda porque não tem tempo, quanto a trabalhar percebemos que preside ao conselho de veteranos, uma súcia onde só têm lugar os que têm mais matrículas no cadastro, isto é, os mais cábulas. É assim que funciona o órgão praxador em Coimbra, que quase todos os outros estabelecimentos de ensino, dito superior, imitam e refinam. 

A praxe é desde há muitos anos, salvo alguns breves períodos de maior lucidez colectiva, uma das imagens de marca da Universidade de Coimbra. A imagem do aluno cábula, boémio, estoira-vergas e pilha-galinhas, sempre se sobrepôs à do aluno dedicado ao estudo. A chamada tradição praxista coimbrã, que não deveria  confundir-se com as actividades de índole cultural, mas é propositadamente confundida pelos dirigentes estudantis como forma de branquear os vandalismos cometidos pelas praxes, radica-se nos tempos em que a Coimbra chegavam sobretudo os filhos das famílias mais abastadas do reino. As excepções, suportadas pelas mais diversas razões, confirmavam a regra. Quem não tinha recursos que lhe permitissem chumbar e continuar, ou tinha objectivos menos lúdicos, não podia permitir-se ou não se permitia a estoirar tempo com praxes. 

Nos tempos que correm, as praxes alastraram para outros territórios, mas continua a valer a lei de que "quem cabritos vende e cabras não tem de algum lado lhes vem", o mesmo é dizer que, se há pseudo estudantes, ditos veteranos, que chumbam anos a fio, e se tornam por essa qualidade mordomos das praxes, ou são filhos de gente rica ou se abotoam com recursos alheios. 

O que há de profundamente errado em tudo isto é o consentimento das universidades na aceitação de reprovações ou desistências sucessivas sem prescrições que impossibilitem a continuação destes abusos na utilização de dinheiros públicos. Cada estudante tem um custo para o erário público. Não é legítimo que a veterania pseudo estudantil de alguns seja paga por aqueles que trabalham e pagam impostos.

Retirem as universidades a estes pândegos (designação benigna) a possibilidade de repetências sucessivas e, talvez então, as novas gerações de estudantes possam acertar o passo com aquelas com quem terão de competir na vida. E, muito naturalmente, as praxes passarão à história.

3 comments:

Unknown said...

curiosamente os eleitores repetem o que os arautos das frases feitas dizem que o ensino deve ser gratuito, sem usarem a cabeça para um pouco mais de critério e não demagogia = para quem ?, quando? durante quanto tempo? em todos os cursos?
enfim mesquinheses que quem paga normalmente gosta de saber para decidir se deve ou nãopagar.

Rui Fonseca said...

Tal e qual.

Sérgio de Almeida Correia said...

Exactamente. É isso mesmo que também penso.Essas matrículas acabam todas por sair do nosso bolso, constituindo péssimo exemplo.