Sunday, March 20, 2016

DEPOIS DOS JACARÉS

7/01/1986

Jacques Cousteau e os seus companheiros continuavam há dias na Amazónia, desta vez com os caçadores de jacarés.

Enquanto esfolava a barriga dos repteis, um entrevistado elucidava que só a pele de baixo lhe interessava por ser  mais macia e boa para cintos. Os restos dos cadáveres jogava-os ao rio para almoço das piranhas. 

- Mas, por este andar, amigo, vocês ainda acabam com os jacarés...  
- Nesse dia vou deixar de caçar, disse o homem com a maior naturalidade deste mundo.

Quem ouviu deve ter chorado lágrimas de crocodilo. 
A perspectiva imediatista comanda as sociedades modernas. A era da incerteza é a era do esgotamento. Morra Marta, morra farta. 
Vão longe os tempos das catedrais. 

Lembrei-me, a propósito, do sr. Perez, um galego que, não sei porque caminhos, caíra um dia nos meus sítios. 
Plantava obsessivamente oliveiras, e, sendo tão velho e sem filhos, ninguém entendia a persistência do caturra.
Morreu o velho Perez há muito tempo já. As oliveiras passaram para a companheira, velha como ele, e dela para os sobrinhos do seu primeiro parceiro, que emigraram, e nunca mais as oliveiras viram donos.  Abraçaram-se a elas os silvados e neste arraial bailavam a pardalada, as rolas e outros solistas, regalando a alma do Perez que por ali pairava nas noites de calmaria. 
Até ao dia em que o fogo a cremou.  

Passaram os anos, em todas as redondezas morreram os olivais. E só ressuscitaram os silvados e as pedras. 

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