Sunday, March 27, 2016

BIA SACRA

...
- Vivo perto daqui, e vim ver.
- E está a gostar?
- Muito, estou a gostar muito!
- E porquê? Posso perguntar-lhe porquê?
- Olhe, porque é a nossa língua, a nossa cultura, as nossas tradições ... sei lá que mais ... é por tudo isso ... vem muita gente de fora ... está aí a televisão ... se não fosse isto ninguém se lembrava da gente ...
- A senhora fala mirandês?
- Não senhor, mas entendo ... E fácil de entender ... muito fácil mesmo ...
- E o que é que está a gostar mais? 
- Estou a gostar de tudo ... das roupas ... dos versos ...
- E da crucificação, o que é que pensa da crucificação? 
- Também gosto, sim senhor, está muito bem representado. 
- Gostou de ver aquele homem a carregar o madeiro, a coroa de espinhos,...
- Gostei, gostei ...
- O sangue ... 
- Aquilo não é sangue, senhor ... aquilo é ... sei lá o que é ... é tinta ...é uma tinta qualquer ...
- E se fosse mesmo sangue, se soubesse que fosse mesmo sangue, também viria assistir?
- Talvez ... sim ... acho que viria na mesma ... 
- E gosta de o ver agora ali, ... pregado na cruz que ele transportou?
- Sim, acho que sim, acho está muito bem feito ... muito real ...
- E se tudo isto não fosse teatro, se, de repente, desse conta que estava perante a situação real, pensa que, ainda assim, teria gostado de ver?
- Não, acho que não ... quer dizer ... olhe, não sei ... acho que fiquei baralhada ... oh, senhor!, o senhor não será o mafarrico?



1 comment:

IsabelPS said...

Nunca mais consegui fazer entrar o meu marido, californiano, numa igreja desde que lhe mostrei um prato com a cabeça de S. João Baptista na catedral de Amiens (que ele estava a fotografar com muito gosto até aí).