Às seis e vinte da manhã de hoje, no IC19, pouco depois da saída de Sintra, via-se no lado contrário, sentido Lisboa-Sintra, um carro de pneus para o ar. Aquela hora o trânsito ainda era escasso, não provocava congestionamento de trânsito nem de um lado nem do outro da via rápida. A polícia já estava junto da viatura capotada. No IC19, o anormal é não haver frequentes acidentes de trânsito.
Três horas depois, o carro capotado estava na mesma, o congestionamento de trânsito provocava a perda de milhares de horas de trabalho.
Porquê? Haverá várias razões, algumas das quais só não vê quem não quer ver.
A intensidade do tráfego, porque o comboio não é alternativa para muita gente que se faz transportar de pópó com uma média de ocupação de menos de 1,2 passageiros por automóvel circulante naquela via rodoviária. Aliás, o comboio, que deveria ligar em triângulo circulante, Lisboa - Sintra - Cascais, ou no sentido inverso, é impossível porque não há ligação ferroviária entre Sintra e Cascais. Porquê? Nunca vi esta pergunta em nenhum lado e, não havendo pergunta, não há resposta. A qualidade do transporte ferroviário em Portugal coloca o nosso país abaixo do nível dos mais atrasados na União Europeia. O transporte ferroviário suburbano não escapa à situação geral.
Tanto tráfego automóvel não impede, provavelmente até incentiva, muita rapaziada a ziguezaguear, talvez para lhes manter em níveis elevados os depósitos de adrenalina.
O respeito pela sinalética de velocidade máxima só é, em geral, respeitada, se o volume de tráfego não permitir gincanas.
O que terá provocado uma capotagem, aquela hora, quando o trânsito era mínimo, num troço recto da via? Excesso de velocidade animado por excesso de alcool emborcado durante uma noite de pândega? É uma hipótese possível mas não passa de hipótese. A qualquer um que ande na estrada, pode acontecer um acidente. Mas que a incidência de acidentes na estrada provocados por elevados níveis de alcool no sangue de condutores de veículos em Portugal é elevada parece indesmentível.
Mas os portugueses não se embriagam apenas com vinho. Pelo contrário, os mais jovens, os que mais gostam de ziguezaguear, emborracham-se com cerveja e, pior que isso, com bebidas de elevado teor alcoólico, whisky sobretudo. É difícil desanimar o consumo de vinho porque isso desafiaria a fúria de produtores e distribuidores portugueses. Mas o whisky, porque não se limitam as vendas em espaços concessionados para o efeito e se enchem prateleiras de whisky nos supermercados? Pelo Natal, então, é um festival!
(Declaração de interesses - Não sou, nunca fui abstémio, filho de um pequeno vitivinicultor, se tivesse tido oportunidade e meios teria gostado de prosseguir e alargar o mais possível o nosso interesse familiar pela vinha. Encanta-me, sempre me encantou e continua a encantar ver uma vinha bem tratada)
--- Correlacionado
Do Semanário Expresso desta semana, retiro
daqui, de uma prosa espirituosa e bem esgalhada,
" Nos últimos cinco anos, o consumo de álcool e tabaco
aumentou em Portugal. Em contraciclo. É o país do mundo que mais consome
vinho per capita e tem vindo a aumentar.
Bem sei que somos um país produtor de vinho, mas não pode ser bom. Os
mais velhos consomem vinho e os mais novos, cerveja. Ao falar dos dados
da década 2012–2022, há dois meses, João Goulão, subdiretor-geral do
Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências,
disse que “quando falamos de embriaguez, as coisas pioram em todos os
grupos etários”. E nos grupos etários mais baixos, dos 13/14 anos, “os
consumos das raparigas ultrapassam os dos rapazes e são muito altos”. E
ainda: “Nestes dez anos, em vez de ganharmos, perdemos para as questões
de saúde relacionadas com álcool.” Mas nem tudo são más notícias.
Portugal é, segundo o Eurostat, o país da UE onde se bebe mais álcool,
mas não é dos países onde há mais episódios de binge drinking, de beber à bruta num dia. Era suposto isto alegrar-nos. O
álcool é um problema grave neste país. Fingimos que não. Cada português
consome mais de 12 litros de álcool puro por ano. E já se sabe como são
as médias. Se eu não bebo, alguém está a beber 24 litros. Mas, acima de
tudo, está inculcado no inconsciente nacional. Ao longo destes anos que
não bebo (às tantas tornou-se uma teimosia engraçada), não consigo
contar quantas pessoas ficaram verdadeiramente chateadas, aborrecidas,
indignadas, desapontadas e muito desconfiadas por eu ter recusado
simpaticamente o copo de vinho, licor, aguardente — ou por eles feitos,
ou para acompanhar a refeição, ou o champanhe para celebrar o momento —,
apenas e só pela justificação que me parece justa: não bebo. Ali, a
indignação do momento foi sempre o meu desrespeito pelo anfitrião. E não
o facto de ele estar a exigir que quebrasse um princípio de vida. Sei
que nem se apercebia. Mas, sim, quem era o merdoso da situação? “Custava
alguma coisa fingir que bebias?” É apenas #anossaCultura.
2 comments:
Quero acreditar que boa parte dos consumos atribuídos aos Portugueses seja dos turistas que nos visitam.
Gostaria de obter a confirmação de que a minha suspeita é correcta.
Já agora, vai o elogio pelos textos que ao longo de já muitos meses aqui tenho lido, a maioria dos quais eu gostaria de ter subscrito.
Cumprimentos
amf
Obrigado pelo seu comentário.
Não tenho informações sobre o consumo de alcool, e, nomeadamente de vinho, pelos turistas que nos visitam. É certo que bebem, mas quanto não sei nem sei se alguém sabe. Suponho, contudo, que esse consumo não terá valor relativamente expressivo no total consumido.
Volte sempre!
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