Wednesday, October 24, 2012

O APRENDIZ DE FEITICEIRO E A SUA SOMBRA

O sr.* Passos Coelho afirmava há dias que está indisponível para ser queimado em lume brando, reagindo ao silêncio do sr. Paulo Portas sobre a votação favorável do CDS do OE 2013 na Assembleia da República.
 
Há nesta afirmação do sr. Passos Coelho uma ingenuidade imensa ou uma ignorância sem limites. O sr. Passos Coelho não está ser queimado em lume brando porque, por razões que só ele saberá explicar mas nós somos capazes de adivinhar, se bateu para agarrar num testemunho que não estava apenas sobreaquecido porque pegou, supõe-se que conscientemente, num tição a arder. Mas não se limitou a agarrar no tição em chamas a cair das mãos do anterior incendiário. Não: prometeu mundos e fundos para garantir o poder de manobrar o chuço incendiado.
 
O sr. Passos Coelho tinha, à partida, algumas boas razões para combater o fogo em que se quis envolver limitando as consequências a queimaduras de primeiro grau. Tinha garantido uma maioria absoluta na AR, tinha um memorando de entendimento negociado pelo seu antecessor e o compromisso conjunto do seu parceiro de coligação e daquele que tinha suportado o principal fautor do incêndio. Primeiro erro dele: dispensou do combate ao incêndio o principal incendiário.
 
Segundo erro: desviou-se do compromisso assinado pelo trio e das promessas feitas para que lhe fosse entregue o testemunho incandescente. Tendo prometido não aumentar impostos e cortar das gorduras do Estado, tendo assumido ajustar o défice às exigências da troica, contribuindo a redução da despesa com 2/3 do esforço e o aumento das receitas com 1/3, o sr. Passos Coelho fez mais do que o contrário.
 
Terceiro erro: Considerou redução de despesa o corte de salários e pensões aos funcionários públicos e aos reformado da segurança social colocando-os perante o dilema de aceitarem os cortes ou verem os salários e pensões suspensos, sem cuidar da constitucionalidade da medida. Foi contrariado pelo Tribunal Constitucional e obrigado a anunciar uma enorme subida de impostos que, atingindo quem não sente as consequências do efeito imediato de um corte de financiamento externo, alastrou o incêndio.
 
É neste contexto crescentemente ao rubro que uns reclamam a intervenção do sr. Cavaco Silva, outros recomendam que ele não se mexa, ou se se mexer que não se note, e o senhor Seguro, como o incumbente, por ingenuidade ou ignorância sem limites se diz preparado para governar o incêndio mas só após eleições, antecipadas, supõe-se.
 
Tanto o sr. Passos Coelho como o sr. Seguro foram guindados aos lugares que ocupam por minorias partidárias que se auto promovem na base de compromissos sobre vantagens futuras. O sistema democrático encontra-se, deste modo, inquinado à partida por uma prática partidária entregue a poucos indivíduos preparados para governar e a uns poucos milhares de arrivistas. Tendencialmente, ganham os líderes destes, e os portugueses são obrigados a votar num deles. O sr. Francisco Assis, durante as últimas eleições directas do secretário-geral do PS denunciou, não interessa neste caso a razão última, o entorse democrático do sistema. Foi derrotado.
 
Resultado: Quando um dia destes o sr. Passos Coelho estiver politicamente esturricado, o sr. Seguro que promete fazer o que não sabe, conseguirá o que mais deseja na vida - governar, nem que seja por um dia.
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Nota - O designativo - sr.- é incomum em Portugal e, por isso mesmo, distintivo na abundância de doutores-da-mula-ruça. O doutor Alfredo Barroso não é um senhor, por peremptória reivindicação que ia fulminando a senhora Teresa Caeiro.
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Correl. - Depois do CDS afirmar que não concorda com o OE 2013 mas votará favoravelmente a sua aprovação por uma questão de interesse nacional, também o PSD, invoca o mesmo argumento para justificar idêntica posição. O PS, também por uma questão de interesse nacional, votará contra. Obviamente, PCP e BE, aspas, idem aspas. Desencontros, em nome do interesse nacional.

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