Wednesday, December 28, 2016

HISTÓRIA FRICCIONADA

“Pode sempre detectar-se um tolo: é o homem que diz conhecer qual é o candidato que vai ganhar uma determinada eleição. Porém, uma eleição é algo de vivo, poderá até dizer-se que não existe seja o que for mais vigorosamente vivo, com milhares e milhares de cérebros, pernas, olhos, pensamentos e desejos, que podem ziguezaguear, voltar-se e tomar direcções que ninguém previra, muitas vezes só pelo gozo de provar que os sabichões estavam enganados. Foi uma das coisas que aprendi no dia passado no Campo de Marte”. - aqui

Interessante, sem dúvida. 

Não sei, no entanto, se consistente com as fontes em que o autor encheu o pote com que cozinhou a sua novela.
A ficção sustentada em personalidades e factos históricos é apelativa, alcança lugares cimeiros nos rankings dos best sellers. Resumindo, num chavão comum "é o que está a dar". O sr. José Rodrigues dos Santos é, por agora, entre nós, o exemplo mais bem-sucedido na capacidade de engrolar a história. Ainda não alcançou a projecção mundial e os proveitos de um Dan Brown mas continua afanosamente a trabalhar para isso.
Não me agrada a História ficcionada porque nem é ficção nem é História mas uma forma de fazer fortuna distorcendo, porque inventando, uma história onde o leitor desprevenido é levado a absorver como realidade aquilo que não passa de ficção. 


Perguntar-me-á: Mas, por exemplo, Shakespeare não recorreu à História para construir a mais grandiosa obra da literatura ocidental? Recorreu, e não tão raramente traiu, mas a sua genialidade é tanta que são quase irrelevantes para o leitor ou expectador os nomes dos personagens. Podiam ser outros e não se perturbava a essência da obra. Para além disso, a literatura como a arte, ou é original ou não é arte nem literatura. Um fulano que hoje pinte como Degas pintava pode ser bem-sucedido (e muitos são) se o fizer como falsário. Se for suficientemente habilidoso mas honesto, assumindo a sua autoria, não venderá as obras que produza pelo preço que lhe custam as telas e as tintas. 

O último período do seu texto é exemplar desta forma insinuante de revisitar o passado e moldá-lo às recentes falhas estrondosas das previsões sobre o Brexit ou a eleição de Trump. 
Tirão, se escreveu o que Harris cita, deve ter, momentaneamente, esquecido que as votações na Roma Antiga dependiam mais da força das armas e do poder do dinheiro que da vontade manipulada pelas redes sociais da actualidade. 

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