em 4 episódios, na RTP1.
Tinha 14 anos quando li Fernão de Magalhães. O homem e sua ação (Biografia) 1938, de Stefan Zweig.
Ainda hoje considero esta obra o livro de aventuras maior que li.
A Peregrinação de Fernão Mendes Pinto, escrita 400 anos antes pelo grande aventureiro, ressente-se de algumas dúvidas, nunca claramente esclarecidas, sobre a veracidade de alguns episódios relatados pelo protagonista.
São incomparáveis porque se, por um lado, as acções relatadas nestas duas grandes odisseias foram quase contemporâneas, por outro, foi grande a distância entre os momentos em que foram escritas.
--- 26/10/24
A propósito...
Há 13 anos, anotei neste caderno de apontamentos um caso - Cábulas & Cª. - com, entre outro outros maus cábulas, o Psioca, distribuidor de um segredo.
Hoje, lembrei-me do Psioca a propósito da Odisseia de Fernão de Magalhães.
O
Psioca habitava em casa de um tio que, segundo se dizia, era
despachante oficial na alfândega local, que não tinha filhos e,
presumivelmente, adoptara o Psioca.
Nunca
soube nem procurei saber se aquele nome Psioca era herança do tio; o
que todos sabíamos é que o tio do Psioca era um coleccionador de livros
antigos, primeiras edições …, um bibliófilo.
Também nunca soube se o Psioca se interessava pela colecção do tio.
O que todos sabíamos era que o Psioca tinha uma capacidade de memorização de textos muito fora do comum.
Tanta,
que o professor de História, desconfiado com as suas respostas em
pontos escritos, quase ipsis verbis com o texto do livro único, o
chamava de vez em quando ao estrado para interrogatório, e confirmava-se
perante a turma que o Psioca um dia daria um magnífico actor. Com um
senão que, para a carreira artística, não seria obstáculo: o Psioca
reproduzia o que lia mas ficava bloqueado quando o professor, depois de
muito insistentemente ter ensinado a turma que, mais do que o relato dos
factos, importavam as causas que os determinaram e as consequências
deles resultantes.
Convenhamos
que o professor parecia esquecer-se que estava perante uma turma de
alunos na banda dos treze, catorze anos, e o Psioca decorava mas só
muito por acaso entendia o que dizia.
Há muitos casos assim.
Havia na sala uma estante, armário de pinho, um dois por dois, com prateleiras onde habitavam solitários cinco ou seis livros.
Um dia, pôs-se o prof a olhar por largo instante para a estante, e turma à espera de ver o que dali saía.
- Temos ali aquela estante, vamos tratar de
arranjar mais livros e passar a considerá-la a nossa biblioteca; trouxe esta porca de barro para recolha de moedas; à medida que a porca encher, compraremos livros
para a biblioteca; mas a biblioteca também não se importa que tragam
livros que ninguém costume ler lá em casa.
A
porca recolheu pouco, mas as estantes ficaram cheias em menos de duas
semanas: havia de tudo, mas sobretudo exemplares antigos e mal tratados do Mundo de
Aventuras e do Cavaleiro Andante, que foram deitadas na base da biblioteca lhe para
baixar o centro de gravidade e evitar que tanta sabedoria doada viesse a
tombar em cima de alguém em caso de ocasional encontrão.
O
Psioca, só à sua conta, encheu uma prateleira. O teu tio sabe disto?
Disto, de quê? Não, o tio não sabia, nem saberia, mais livro, menos
livro lá em casa, ninguém daria por isso.
Aquela
biblioteca sem espaço para mais doações era um orgulho para a turma.
Talvez para não diminuir a dimensão de tanto orgulho ou porque quanto
mais livros pela frente menor era a vontade de os ler, nem a chamada de
atenção de que os livros estavam na estante para serem retirados e
lidos, mobilizou a turma para a leitura.
Estávamos
em vésperas de férias de Natal e, para não ficarem mal vistos pelo prof, a maior
parte levou um livro para ler durante as férias.
Eu levei “Fernão de
Magalhães - biografia de Stefane Zweig”, uma primeira edição da obra em
português, adquirida num alfarrabista do Largo Trindade Coelho, em
Lisboa.
Seguramente, retirada pelo Psioca da colecção do despachante oficial, sr. Psioca, que tinha metido o recibo no meio do livro.
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