Já depois de ter editado o meu apontamento de anteontem - O valor dos valores morais - observei que Daron Acemoglu, um dos três laureados com o Nobel da Economia, e aquele que, em directo televisivo respondeu a questões que, a propósito, lhe foram lhe foram colocadas por alguns dos presentes na sessão do anúncio, observei que de Daron Acemoglu tinha sido colocado a 30 de agosto deste ano, um artigo no project-syndicate.org - The Trump Threat to Democracy has grown - de que retiro apenas a primeira parte, disponível para não assinantes.
"Donald Trump is not the first anti-democratic demagogue to atttract a strong following, and he will be not the last. American institutions can weather such challenges and come out even stronger, but only if pro-democratic forces mobilize and demonstrate that the system can deliver meaninful results for ordinary people"
O artigo é, relativamente, longo e aponta para a gravidade da situação criada pela impotência das instituições democráticas norte-americanas, que não foram concebidas para defrontarem quem, além do mais, proclama governar sem submissão às regras democráticas e fomentou o assalto ao Congresso, símbolo maior da democracia norte-americana, sem que a Justiça, admito, por falta de previsão de enquadramento legal no momento da concepção constitucional, o condenasse por alta traição e agora permite que se recandidate para comportamentos muito mais gravosos nos Estados Unidos quando de todo o mundo chegam sinais de guerra definitiva.
No meu apontamento de anteontem parti da conclusão dos laureados - "In the end, the only option may be to transfer power and establish democracy." - expressa, tanto na transmissão televisiva da comunicação do Nobel da Economia deste ano como no "Press release", para registar neste caderno de apontamentos a desvalorização que, do meu ponto de vista, tem vindo a observar-se na democracia liberal.
Há alternativa melhor?
Durante muito tempo adquiriu-se a ideia cimentada na afirmação de Churchill: "A democracia é a pior forma de governo, excepto todas as outras que têm sido tentadas de tempos em tempos."
Talvez Churchill continue a ter razão e a resposta dada a um dos assistentes ao anúncio do Nobel no período de perguntas e respostas que questionou sobre o sucesso da China, um país cujo líder Li Xijinping considera a democracia um dos inimigos do comunismo chinês, Daron Acemoglu recordou que alguma experiências ditatoriais foram bem sucedidas durante os primeiros tempos, mais ou menos longos, mas perderam perderam o ímpeto inicial e a democracia acabou por prevalecer.
No tempo que vivemos, com os regimes autocráticos a ganharem terreno por recuo dos valores morais da democracia, a afirmação de Daron Acemoglu de 30 de agosto no Project Syndicate, atrás transcrita, de que "as instituições norte-americanas podem opor-se à força das multidões atraídas pelas promessas de Trump, um anti-democrático demagogo, se as forças pró-democráticas se mobilizarem e convencerem que a democracia é mais vantajosa para as pessoas comuns, carece de prova.
Porque é neste ponto se contradizem as conclusões.
Kamala Harris posicionou-se nas sondagens à frente de Trump imediatamente à sua nomeação em substituição de Biden. O voto popular, segundo as sondagens, posicionavam Harris entre dois a três pontos percentuais acima de Trump. Entretanto, a diferença ter-se-á reduzido, colocando-se num intervalo de empate técnico.
As eleições presidenciais norte-americanas não se decidem pelo voto popular universal mas pelo voto em seis ou sete Estados, swing states onde o resultado final pode cair para um lado ou para o outro, e onde as sondagens sugerem agora ligeira diferença favorável a Trump.
Conclusão: as forças pró-democráticas parecem incapazes de atrair em número suficiente aqueles eleitores que, aparentemente, mais ganhariam com a vitória de Harris.
Kamala Harris, filha de mãe indiana e pai afro-jamaicano, é considerada, estatisticamente, negra.
É, no entanto, a candidata democrata com menos apoio da população negra, quando, (ou porque), uma mulher negra substitui um homem branco. Biden obteve 87% dos votos dos negros; Harris tem apenas 80%.
Trump tem dito, e os seus apoiantes acreditam, que os imigrantes roubam empregos geralmente desempenhados por negros. Mais imigrantes negros a entrarem nos USA significará mais pressão para a baixa nos salários. Deste raciocínio decorre, mesmo se falacioso, serem os negros, os asiáticos, os hispânicos mais favoráveis a medidas repressivas da imigração que os brancos.
Também são os não brancos menos tolerantes relativamente à liberdade de opção sexual e tão misóginos quanto os brancos.
A perda de empregos resultante da entrada de emigrantes é o valor facial, visível, da imigração; o crescimento de uma economia em expansão, como é o caso da economia norte-americana, hoje, que requer mais força de trabalho, é um valor intrínseco que poucos entendem.
Trump entende, mas interessam-lhe os votos dos que já residem nos EUA. As suas declarações de que procederá à maior deportação de imigrantes ilegais, reforça nos imigrantes legalizados o apoio que Trump procura mobilizar.
A lista é longa mas uma evidência se salienta: qualquer que seja o tema envolvendo a importância da democracia para o progresso dos povos, é mais estendível o seu valor facial, a aparência imediata, do que o seu valor intrínseco, aquele que só o tempo pode demonstrar.
Quando se vivem tempos de comunicações curtas e fáceis, o imediatismo, mesmo se falso, porque o falso é célere e a verdade lenta, sobrepõe-se a razões fundamentadas.
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