Afirmou ontem o sr. Arménio Carlos, secretário-geral da CGTP, que "qualquer negociação sobre o descongelamento das carreiras terá de passar pelo pagamento do retroactivo aos trabalhadores da função pública". "O Governo tem de assumir as suas responsabilidades pagando o que deve aos trabalhadores". - cf. aqui.
Só os trabalhadores da função pública, sr. Arménio Carlos?
E os pensionistas e os reformados que viram as suas pensões e reformas cortadas?
E os trabalhadores dos sectores privados que viram os seus salários reduzidos e os seus horários de trabalho mantidos ou aumentados, não são gente neste país?
Por outro lado, o sr. Arménio Carlos, e todos quantos neste país lêem pela mesma cartilha, confundem, para nos confundir, o Governo com o Estado e o Estado com os contribuintes.
Porque o sr. Arménio Carlos sabe, toda a gente sabe ou deveria saber, que o Governo não paga nada, o Estado não paga nada, quem paga são os contribuintes, entre os quais, valha a verdade, também o sr. Arménio Carlos é suposto incluir-se.
O Governo, este governo, qualquer governo, sr. Arménio Carlos, não paga, manda pagar.
Manda a quem? Aos contribuintes!
De modo que o que o sr. Arménio Carlos, o sr. Mário Nogueira, a srª. Ana Avoila, quando reclamam melhores condições e retribuições para a função pública, se essas condições são aceites pelo governo quem paga são os contribuintes.
Se os senhores jornalistas não confundissem, também eles, governo com Estado e Estado com contribuintes, o sr. Arménio Carlos seria obrigado a mudar o tom das suas exigências.
11 comments:
Oportuno e incisivo post, caro Rui.
Acontece que Arménio Carlos, Mário Nogueira, Ana Avoila,grande parte das redacções dos media...é tudo farinha do mesmo saco. Isso explica tudo.
E nós pagamos um estado cada vez mais avassalador.
Obrigado, António, pelo teu comentário.
Bem de facto está aqui um bom trocadilho de palavras para confundir ideias e princípios. Os serviços do estado não aparecem de mão beijada ou por obra e graça do divino espirito santo. São fruto do trabalho de diferentes pessoas que por inerência do seu trabalho são funcionários públicos. Não são bichos esquisitos ou parasitas como se pretende induzir as pessoas Como qualquer outro trabalhador tem direito a um salario e direito a revindicar melhores condições. Ao contrario de muitos outros trabalhadores neste tempo de crise foram os funcionários públicos que mais tiveram que ceder em termos salariais e de condições de trabalho. Não vi ninguém dizer que era demais e que deviam ser tratados como os demais. Quando se pede para repor salários não se está a querer usufruir de benesses ou bem querenças.
O estado gasta aquilo que acha que deve gastar. Nós como contribuintes devemos escrutinar estes gastos como bem empregues ou mal empregues. Agora concluir que uma revindicação de reposição de salários é dinheiro mal empregue vai uma grande distância. Se a prestação do trabalho varia-se com a relação salarial não ia gostar de ser atendido num organismo do estado em que só lhe prestassem parcialmente este atendimento ( na relação directa da baixa salarial do funcionário publico).
Afirma Anónimo que "Ao contrario de muitos outros trabalhadores neste tempo de crise foram os funcionários públicos que mais tiveram que ceder em termos salariais e de condições de trabalho."
Não sei em que fonte estatística baseia a sua afirmação.
Nada me move contra os funcionários públicos, que me merecem o maior respeito. O que ninguém pode negar é que os funcionários públicos conseguem uma protecção sindical que os trabalhadores do sector privado não conseguem.
O meu apontamento, no entanto, tem outro alcance, que o Anónimo não pode contrariar.
As reivindicações, salariais ou outras que se traduzam em valores monetários, são pagas, quando atendidas pelos governos, pelos contribuintes.
E não pelo Estado ou pelos governos. Os governos são tutores de uma entidade sem capacidade volitiva (o Estado) e tendem a ceder às pressões que ameaçam as suas posições no poder.
Quem paga, os contribuintes, é um conjunto disperso de interesses e vontades que geralmente não se apercebe da confusão de nomes que abordei.
O dinheiro do Estado é o dinheiro de todos nós. Até aqui tudo bem.
A partir daqui é como o dinheiro é gasto ou seja como é aplicado. O Estado tem de garantir determinadas funções para que a sociedade consiga funcionar - defesa, proteção, educação , saúde, finanças, etc. Para isso precisa de trabalhadores que por trabalharem para o estado são funcionários públicos. Se as funções que o Estado desempenha não são as adequadas ou não se realizam de maneira efetiva já é outro problema. Do ponto de vista sindical existem sindicatos mais fortes e sindicatos menos fortes e isso não tem haver com o Estado tem haver com a consciência de classe e a capacidade de revindicação de cada sector. No sector privado também existem sindicatos fortes com boa capacidade reivindicativa.
Podemos depois discutir a função do Estado no equilíbrio social e na sua capacidade de redistribuir a riqueza produzida por essa sociedade. A Coleta advém do trabalho e do capital e aqui também se pode começar por discutir a justiça desta coleta pois os números apontam nos últimos tempos para um desequilíbrio nítido entre o ganho e a coleta quer se trata o trabalho quer se trata do capital.
"e isso não tem haver com o Estado tem haver com a consciência de classe e a capacidade de revindicação de cada sector."
Tem a ver com a capacidade de reivindicação do sector público face ao governo, que não tem de pagar mas mandar pagar os contribuintes.
De facto pagar trabalho deve ser uma coisa muito má e eu ainda não tinha dado conta disso. Mas o Estado gastar os mil milhões que gastou a pagar imparidades de determinados banqueiros que desbarataram dinheiro para amigos e em esquemas fraudulentos já não é tido em conta. São fatalidades que acontecem simplesmente.
Mas visto isto numa prespectiva económica o dinheiro pago aos funcionários públicos vai alimentar a economia local ao ser dispendida em bens ou serviços ao passo que o dinheiro dito para salvar bancos vai-se volatilizar no infindável éter do mundo financeiro. Quanto á polémica de quem paga pagamos todos o que trabalhamos em maior mediad pois a colecta continua a pender para quem trabalha. (incluindo funcionários públicos)
"Mas o Estado gastar os mil milhões que gastou a pagar imparidades de determinados banqueiros que desbarataram dinheiro para amigos e em esquemas fraudulentos já não é tido em conta. São fatalidades que acontecem simplesmente."
Se Anonymous ler o que escrevo há mais de onze anos neste caderno de apontamentos concluirá que há mais de onze anos venho repetidamente denunciando as moscambilhas no sector financeiro.
Quando ainda ninguém falava no assunto. Basta-lhe que confirme em alguns apontamentos iniciais, nomeadamente alguns que intitulei "Contos da água tónica".
Tem tudo a haver com o que tem escrito pois passo por aqui regularmente a perscrutar a sua opinião. É por isso que não entendo reduzir uma questão relacionada com o salario que por ser pago pelo Estado tem que estar limitado ou de alguma forma é condicionado por ser o Estado. O Estado assume aqui como qualquer outra entidade patronal o papel de pagador portanto defende a diminuição da despesa. Mas não podemos esquecer o seu papel regulador e orientador em relação ao valor do trabalho e daí as suas escolhas conforme a politica seguida( esquerda / direita). Não esquecer que neste tempo de crise e devida á conjuntura económica em que foi construído o euro a desvalorização do trabalho tem desempenhado um papel crucial naquilo que acham ( uma questão de politicas)ser o ajustamento mais adequado para os países do sul.
Anonymous:
O que é o Estado? Onde é que ele mora?
O Estado enquanto entidade com capacidade volitiva, não existe.
Não devemos invocar o nome do Estado em vão.
Podemos considerar o Estado como um conjunto de interesses comuns que são administrados por aqueles que, de um modo ou outro, elegemos para governar. E são esses que decidem e, geralmente, cedem perante as forças que condicionam os votos que lhe permitem o acesso ou a sua continuidade no poder.
Fiz-me entender?
A coisa está entendida mas ao querer ver o Estado/ Governo como uma entidade condicionada tem que o fazer em toda a sua plenitude. Se está condicionada pelo acontecimento eleitoral está-o em toda a dimensão. Quantos funcionários públicos temos? Quanto representam do eleitorado? E o restante não condiciona as opções politicas? Reduzir estas questões aos funcionários públicos é a meu ver estar a encontrar um bode expiatório para uma imensidão de objeções que qualquer governação nos traz. Não consigo vislumbrar quer a abrangência quer a dimensão que quer dar ao problema. Qualquer negociação tem sempre cedências de parte a parte e depende em qualquer momento dos pontos fortes ou fracos que cada uma das partes patenteia. Lembro-me de em muito novo ter feito um trabalho sobre e Estado e a sua dimensão nos diferentes tipos de sociedade bem como o seu desenvolvimento ao longo da história no progresso das sociedades. Enquanto entidade abstrata representativa da vontade das pessoas determina pelo querer de uma maioria ou de uma minoria conforme as situações, num determinado período, essa mesma vontade impondo á sociedade quer um modelo quer uma opção politica. Numa perspectiva purística o Estado somos todos nós.
Post a Comment