Quando, ontem, telefonei ao D. Canalizador a requisitar os seus serviços, perguntei-lhe, previamente, como é da praxe, com é que lhe corria a vida.
Respondeu-me que mal, os clientes não lhe pagavam, e ele, que se queria cumpridor para com os seus fornecedores, não tinha meio de honrar os seus compromissos.
Há noite, no Telejornal, ouvi a notícia de que o Governo decidiu promover os pagamentos electrónicos, de modo a reduzir drasticamente a emissão de cheques e, tanto quanto possível, a utilização de notas e moedas. E que vai dar o exemplo.
A medida é ambiciosa, útil a vários títulos, e só pode merecer aplausos.
Contudo, ao ouvir a notícia, não pude deixar de recordar as preocupações do D. Canalizador. Para ele, transferência electrónica ou outra, servia-lhe às mil maravilhas. O problema dele é não ver nada, via electrónica ou outra, a cair-lhe do lado do crédito na conta.
Portugal é, dos países da EU 15, aquele onde são mais longos os prazos de pagamento, e o maior relapso é o Estado. O ciclo vicioso em que se enredam as transacções comerciais em Portugal é, em muitos casos, engendrado pelo comportamento das instituições do Estado. A perturbação deste caloteirismo endémico na vida económica do país não se circunscreve à área financeira das empresas atingidas, porque ocupa grande parte do tempo dos responsáveis, oblitera as suas capacidades e prejudica os negócios a todos os níveis.
Sem esquecer que, electrónica ou não, qualquer transferência em Portugal fica a “flutuar” por conta dos bancos e para seu benefício, em média, três dias úteis. A medida, agora anunciada, poderá aumentar a “eficiência” do nosso já “eficientíssimo” sector financeiro mas não bulirá, minimamente que seja, com a produtividade da economia das empresas não financeiras. Passa-se o mesmo com os comboios: a emissão electrónica de bilhetes não aumenta a velocidade deles.
Quando Mustafá decidiu comprar um frigorífico e transportá-lo para os confins do Atlas, onde a electricidade não tinha chegado, a mulher, que tinha comprado um faqueiro de alpaca, decidiu guardar o faqueiro no frigorífico.
Que pode fazer o D. Canalizador, com um terminal, para pagar aos seus fornecedores por transferência electrónica, com dinheiro que não tem?
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