Já comentámos que a desova das broncas se processa com uma regularidade impressionante ao longo do ano, mas é impossível não reconhecer que a safra tem estado a observar um pico acentuado durante estes últimos dias, talvez em consequência do calor que dilata os corpos e, inevitavelmente, nos amolece os miolos. E nem as sumidades escapam ao flagelo. São tantas e tão nutridas as broncas, dando aos jornais redobradas razões para existir, que não é possível listá-las e comentá-las aqui, ainda que de forma sucinta, porque ficaríamos sem tempo e espaço para outros assuntos menos divertidos.
Dois desses exemplares merecem, contudo, que aqui fiquem registados para a posteridade:
No primeiro caso, e a propósito da bronca mais geral que promete ser para lavar e durar, que é a confusão acerca da repetição das provas de Química e Física do 12º. ano, espanta qualquer cidadão comum que ainda leia jornais, que se um “parecer de catedrático de Aveiro sustenta que prova de Química não tem erros” , no PÚBLICO de 20/7, a “Sociedade Portuguesa de Química…logo a seguir ao exame denunciou a existência de um erro numa das perguntas…” , no EXPRESSO de 22/7.
A Sociedade Portuguesa de Química é suposto acolher o que de melhor as nossas faculdades de ciências formaram e ainda não morreu. Por outro lado, o ilustre catedrático, José Teixeira Dias, antes de avançar com o seu parecer, que pelos vistos lhe foi solicitado pelo Gave (Gabinete de Avaliação Educacional) puxa pelos galões, que não são estreitos:
- 40 anos de serviço, 26 na categoria de professor catedrático, como docente universitário e investigador na área da Química-Física Molecular;
- Fellow da Royal Society of Chemistry (FRSC) desde 1991, tendo-lhe sido atribuído o título de chartered chemist (cchem), após análise do seu curriculum vitae;
Termina o Prof. Teixeira Dias o seu parecer declarando que, na sua opinião, "esta prova não contém erros científicos”.
Para além de ser difícil entender, a não ser por razões de conspiração contra a Ministra ou evidente incompetência de quem estruturou as provas, que não tenha sido antecipado que duas provas desenhadas segundo modelos desiguais conduziriam, necessariamente, a resultados conflituantes, é ainda espantoso que profissionais altamente qualificados discordem acerca de um assunto numa área das ciências (ditas) exactas, em que são peritos, e que fazia parte de um exame apenas vestibular de cursos superiores.
Mais espantoso ainda é que a Ministra tenha perdido o equilíbrio no meio do furacão e lhe tenha dado vontade de chorar no Parlamento. Ela, que é socióloga, pelos vistos não suspeitou que nem as ciências exactas o são tanto quanto se dizem nem os seus profissionais tão peritos quanto deviam.
Se da Física e da Química se espera que suportem os alicerces materiais da nossa vida colectiva, ainda que algumas dúvidas sempre persistam como semente da descoberta, da Justiça precisamos, além do mais, serenidade.
Contudo, o que se passou, ontem, na Ordem dos Advogados, constituiu mais um dos deploráveis espectáculos com que os senhores agentes da Justiça vêm oferecendo ao sereno povo português:
José Miguel Júdice entregou hoje o seu colar de bastonário da Ordem dos Advogados por considerar que ele não deve ser usado por alguém que foi condenado - como foi o seu caso.
Numa audiência que ficou marcada pelo abandono da sala do conselho superior da Ordem dos Advogados, sem que Júdice tivesse terminado a sua defesa, o bastonário afirmou que nunca mais voltará a entrar na sede da Ordem, excepto para «velar colegas mortos».
A intervenção de Júdice provocou um ambiente dramático na sala, que permaneceu cheia de advogados mesmo durante as duas horas que se seguiram ao encerramento oficial da audiência, durante as quais o advogado continuou a falar.
Os membros do Conselho Superior da Ordem dos Advogados que estavam a julgar os processos disciplinares instaurados ao ex-bastonário José Miguel Júdice abandonaram a sala porque o arguido não acatou a meia hora imposta para fazer a sua defesa.
Apesar da saída dos membros do Conselho Superior da sala, às 15:50, Júdice teimou em continuar a fazer as suas alegações diante das cadeiras vazias, mas tendo atrás de si cerca de 150 apoiantes.
O Conselho Superior, presidido por Luís Laureano Santos, queria que Júdice fizesse as suas alegações num limite de tempo de 30 minutos, findo o qual perguntou ao ex-bastonário se ia acabar nos próximos 10 minutos, ao que este disse que não, pois precisava de mais tempo.
Não tendo Júdice manifestado intenção de encurtar as alegações, o presidente do Conselho Superior abandonou a sala, seguido de imediato pelos restantes 15 membros presentes na sessão.
O ex-bastonário continuou então no interior da sala a falar diante das cadeiras vazias, até cerca das 18:00.
O advogado e ex-candidato a bastonário João Correia, amigo e apoiante de Júdice, declarou aos jornalistas que com esta atitude dos membros do Conselho foram violados os direitos fundamentais de defesa de Júdice.
João Correia explicou ainda que, sendo Júdice alvo de dois processos disciplinares, teria direito a meia hora de alegações para cada um dos processos, o que perfaz uma hora, tempo que não lhe foi concedido.
Hoje, a leitura da proposta do relator dos dois processos disciplinares instaurados a Júdice demorou mais de três horas, tendo sido pedida a sua absolvição, alegando que o ex-bastonário desconhecia que estava a violar os Estatutos quando afirmou publicamente que o Estado devia consultar, quando precise, as três maiores sociedades de advogados de Portugal, incluindo a sua.
O ex-bastonário José Miguel Júdice ao expor a sua defesa para as cadeiras vazias do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, teceu várias críticas a este órgão jurisdicional e ao próprio bastonário, Rogério Alves.
Depois de três horas a ouvir os argumentos do relator dos dois processos disciplinares que lhe foram instaurados após duas entrevistas (Jornal de Negócios e RTP-2), informou que não ia cumprir os 30 minutos que lhe foram atribuídos para as suas alegações/defesa e que só saía da sala depois de dizer o que tinha para dizer ou sob prisão ou à força.
Júdice considerou que o presidente do Conselho Superior, Luís Laureano Santos, cometeu uma "violação estatutária censurável" quando "escarrapachou numa acta do Conselho" conversas mantidas com ex- bastonários.
Entendeu ainda que houve violação dos estatutos quando foi informado, apenas telefonicamente, para a instauração do primeiro processo relacionado com a entrevista dada ao Jornal de Negócios a 06 de Abril de 2005, bem como no segundo processo, de que soube pelos órgãos de comunicação social.
Na parte final da sua intervenção, Júdice declarou bem alto: "Esta não é a minha Ordem (dos Advogados)".
Durante as suas alegações, Júdice criticou o relator dos seus processos disciplinares, dizendo que aquele vogal do Conselho Superior demonstrou "não ter condições éticas, jurídicas e psicológicas para julgar nem uma manada, quanto mais advogados".
Falando sempre num tom acutilante, Júdice disse que voltaria a dizer precisamente o mesmo e pediu "encarecidamente" que lhe seja aberto outro processo disciplinar, mas agora como "imputável".
Isto, porque a proposta do relator Alberto Jorge Silva para o primeiro processo disciplinar instaurado a Júdice (por ter dito publicamente que o Estado devia consultar as três maiores sociedades de advogados sempre que precisasse) foi a absolvição, por considerar que o ex-bastonário não teve consciência da ilicitude da sua actuação face aos Estatutos da profissão.
No decurso da sua longa alegação, Júdice disse que não vai recorrer de qualquer sanção que lhe seja aplicada, nem mesmo da suspensão efectiva da actividade profissional.
No segundo processo que lhe foi instaurado, relacionado com uma entrevista de Júdice à RTP-2, o relator propôs uma sanção de quatro meses e 15 dias de suspensão da actividade profissional para o ex- bastonário.
Em tom sarcástico, Júdice respondeu à proposta do relator, dizendo: "Por amor de Deus, condenem-me a uma pena superior à advertência, expulsem-me da profissão se têm coragem".
Para o antigo bastonário, o relator dos processos mostrou "falta de coragem e dignidade" quando, depois do que disse dele, "apenas" propôs quatro meses e 15 dias de suspensão da actividade profissional.
Segundo Júdice, a Ordem dos Advogados está a ser "desprestigiada" pelo comportamento de alguns membros do Conselho Superior.
Entretanto, o Conselho Superior deverá emitir um comunicado sobre o sucedido.
Júdice começou hoje a ser julgado disciplinarmente pelo Conselho Superior da Ordem dos Advogados em dois processos, um dos quais por defender - em entrevista ao Jornal de Negócios, em 06 de Abril de 2005 - que o Estado, sempre que precise, devia consultar as três maiores sociedades de advogados do país, incluindo a PLMJ- AM. Pereira, Sáragga Leal, Oliveira Martins, Júdice & Associados, da qual faz parte.
O Conselho Superior da Ordem, que julga Júdice, é o supremo órgão jurisdicional da OA e é composto por 20 membros, competindo-lhe, reunido em sessão plenária, "julgar os processos disciplinares em que sejam arguidos o bastonário, antigos bastonários e membros dos actuais Conselho superior ou do Conselho Geral".
JORNAL DE NEGÓCIOS 2006-07-22
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