Sunday, July 23, 2017

A DÍVIDA


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Em Novembro de 2012, a Troica realizou o sexto exame regular às contas públicas de Portugal e estimou uma descida da dívida pública em percentagem do PIB para 117,5% no fim de 2016.  
Enganou-se demais.
No fim de 2016 a dívida pública portuguesa atingiu os 130,4% do PIB, depois de uma evolução quase sempre crescente, contrariando as projecções da Troica apesar das medidas de austeridade geralmente cumpridas e num ou noutro caso superadas.
Apesar da continuidade na redução do défice, que atingiu em 2016 valores mínimos recorde em democracia, no fim do primeiro trimestre de 2017, e de alguma animação do crescimento económico, a dívida continuou a subir: 130,5% segundo nota recente do Eurostat*.



(gráfico c/p de aqui)

Porquê?



A divergência entre as projecções da Troica em Novembro de 2012 e a realidade observada quatro anos depois (cerca de 13%) é equivalente ao peso das ajudas ao sistema de financeiro reflectido na dívida.
Em nota divulgada no princípio de Abril do ano corrente e citada aqui, o Banco de Portugal Portugal  informava que "as medidas de apoio ao sistema financeiro representam “aproximadamente 11,3% do PIB na dívida pública de 2016”, que era de 130,4% do PIB."
Naquelas contas do Banco de Portugal não estão, além do mais, ainda incluídos os 2,5 mil milhões engolidos pela segunda recapitalização da Caixa Geral de Depósitos, realizada durante o primeiro trimestre de 2017  - a decisão da inclusão ou não daquele montante no défice só será conhecida em Setembro - nem as perdas efectivas resultantes da nacionalização do BES e da privatização do Novo Banco, processos que levarão vários anos a concluir considerando a litigância a eles associada.

Mas, reconheça-se, seria uma explicação muito redutora atribuir ao estilhaçar da banca a culpa maior da resiliência do crescimento da dívida pública. Mesmo a níveis dos 117,5% do PIB projectados pela Troica para 2016, a persistência do crescimento da dívida relativamente ao PIB seria menos evidente mas não deixaria de ser menos potencialmente perigosa. 


As taxas de juro, graças a Draghi, são baixas e em alguns empréstimos a curto prazo Portugal até tem conseguido ultimamente financiar-se a taxas negativas mas a taxa média continua a ser, considerando a dimensão da dívida, impeditiva da inflexão do crescimento desta. 

Quando os juros subirem, porque um dia destes os juros subirão (parafraseando um conhecido cirurgião, as taxas de juro baixas não auguram nada de bom), se a dívida não tiver sido, entretanto, suficientemente reduzida, o fantasma da intervenção externa continua ao virar da esquina. 

É, deveria ser, nestas condições, preocupante ouvir à esquerda radical reclamar ao Governo mais despesa pública*** - nem toda a despesa pública é má mas é péssima quando se torna incontrolável -  e à oposição barafustar contra as cativações com que o ministro das Finanças procura segurar as rédeas da dívida**. 


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* O Eurostat emitiu anteontem um newsrelease - vd. aqui - First quarter of 2017 compared with fourth quarter of 2016 Government debt up to 89.5% of GDP in euro area Up to 84.1% of GDP in EU28 -
onde a evolução da dívida pública portuguesa durante os primeiros três meses deste ano se destaca pela negativa no contexto dos 28 membros da União Europeia:

Entre o primeiro trimestre de 2016 e o primeiro trimestre de 2017 a dívida pública portuguesa subiu 1,6 pontos percentuais, de 128,9% para 130,5% do PIB.

Dos oito países membros da UE onde se observou crescimento da dívida pública no período em análise - Letónia, Polónia, Eslováquia, Portugal, França, Luxemburgo, Croácia e Reino Unido - Portugal tem a maior dívida pública em percentagem do PIB. Na Grécia e na Itália, com níveis de dívida pública relativa superiores, observou-se redução.
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** A prova de que nenhuma afeição partidária da minha parte suporta  as medidas de M Centeno pode ser confirmada no facto de ter considerado neste bloco de notas, na altura da sua nomeação, o ministro das Finanças um dos elos mais fracos do executivo que acabara de entrar em funções.

*** Não está sozinhos.
"I love debt" - Donald Trump

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