Paul E. Schroeder, na madrugada do dia 3 de Agosto, soube que 14 Marines tinham morrido em Haditha, Iraque. O seu filho Augie encontrava-se naquela região.
Às 10, 45 dessa mesma manhã bateu-lhes à porta um tenente-coronel que, depois de respirar fundo, declarou: “O seu filho é um verdadeiro herói americano”.
Paul, desde então, tem recebido muitas condolências repetindo as mesmas frases: “morreu um herói”, “morreu um patriota”, “morreu pela pátria”. Mas tanta consternação patriótica tornou-se fastidiosa para Paul e para a sua família. Paul pensa que algumas destas pessoas julgam que, dizendo aquilo, a morte de Augie fica justificada, mas a morte na guerra é sempre trágica quaisquer que sejam as razões que a motivam.
“O seu filho é um verdadeiro herói americano”, talvez seja, concede Paul, mas ele não vislumbra na morte do filho nem glória nem honra. Ainda que seja doloroso reconhece-lo, as vidas sacrificadas no Iraque são vidas desperdiçadas porque é um erro completo supor que a democracia pode vivificar pela simples remoção de um ditador.
Não matem mais heróis!, pede Paul E. Schroeder.
Let´s stop this war before more heroes are killed – Washington Post 2005/12/03
O pedido de Paul Schroeder é um grito arrancado pela perda suprema mas o que é saliente nesse grito é a sua convicção de que a vida do filho foi desperdiçada em consequência de um erro de avaliação quase ingénuo: as forças armadas americanas estão no Iraque porque a Administração Bush supõe que pode lá instalar um regime democrático depois de ter aprisionado Sadam Hussein esquecendo que a democracia pressupõe condições vegetativas diferentes.
Paul Schroeder deve saber que, ao contrário da Fé, não há registo histórico que testemunhe a inoculação da Democracia através da ponta das espadas.
O que é estranho é que ele não saiba, ou não desconfie, que George W. Bush e a sua Administração não estejam perfeitamente conscientes desse facto. Mais estranho ainda é que toda a discussão entre o dever estar e o dever sair das tropas americanas do Iraque se esteja a dirimir à volta daquela pretensa ingenuidade. A Bush, por razões politicamente óbvias, depois que se evaporaram os argumentos das armas de destruição maciça, interessa uma razão abnegada por um objectivo heróico, quiçá romântico. Paradoxalmente, uma razão tão desinteressada não é bem aceite pela generalidade da opinião pública mundial, merece grande repúdio na Europa e divide a meio, com tendência para a rejeição, a opinião americana.
Ontem, 5/12, George W. Bush decidiu, num acto quase original e sem precedentes durante os seus mandatos , convocar para uma reunião na Casa Branca treze antigos Secretários de Estado e Secretários da Defesa, um grupo que inclui nomes como Robert McNamara, Frank Carlucci e Madeleine Albright. A reunião terá decorrido de forma civil e aprofundada e o ex-Secretário da Defesa da Administração Carter, Harold Brown, admitiu que a reunião teria como objectivo beneficiar a imagem da actual Administração aos olhos da opinião pública, e, segundo H. Brown teria havido um amplo consenso no sentido de levar as actuais operações de guerra a bom termo.
Com as eleições, a meio do mandato presidencial, para o Congresso e Câmara de Deputados em mira, Bush quer evitar que a guerra no Iraque proporcione vantagens eleitorais aos Democratas e a perda pelos Republicanos da dupla maioria que detêm no Senado e na Câmara dos Representantes. Bush conseguiu esse objectivo na disputa com John Kerry para o mandato em curso e está convencido que os Democratas estão prisioneiros, quanto a este ponto, da inexequibilidade de uma retirada.
É que não estando as tropas americanas a sofrer baixas, quase diárias, no Iraque pela democracia no Médio Oriente, do mesmo modo que não estão, por esse motivo, há largos anos na Arábia Saudita e no Koweit, e onde a preocupação da implantação da democracia alguma vez foi sequer sussurrada, as tropas americanas só podem estar lá por um motivo diferente.
Por não ser politicamente correcto, Bush não dirá nunca que as tropas americanas combatem no Iraque porque aí defendem os interesses vitais dos Estados Unidos, interesses esses que, sobretudo, correspondem à garantia do abastecimento de recursos energéticos indispensáveis. Por tabela, o resto do mundo petróleo-dependente desfruta desta abnegação americana. Hipocritamente, contudo, critica quem abana a árvore e vai enchendo o saco com a fruta que vai caindo ao chão.
Pobre Paul, como é que nunca ninguém te explicou isto?
Às 10, 45 dessa mesma manhã bateu-lhes à porta um tenente-coronel que, depois de respirar fundo, declarou: “O seu filho é um verdadeiro herói americano”.
Paul, desde então, tem recebido muitas condolências repetindo as mesmas frases: “morreu um herói”, “morreu um patriota”, “morreu pela pátria”. Mas tanta consternação patriótica tornou-se fastidiosa para Paul e para a sua família. Paul pensa que algumas destas pessoas julgam que, dizendo aquilo, a morte de Augie fica justificada, mas a morte na guerra é sempre trágica quaisquer que sejam as razões que a motivam.
“O seu filho é um verdadeiro herói americano”, talvez seja, concede Paul, mas ele não vislumbra na morte do filho nem glória nem honra. Ainda que seja doloroso reconhece-lo, as vidas sacrificadas no Iraque são vidas desperdiçadas porque é um erro completo supor que a democracia pode vivificar pela simples remoção de um ditador.
Não matem mais heróis!, pede Paul E. Schroeder.
Let´s stop this war before more heroes are killed – Washington Post 2005/12/03
O pedido de Paul Schroeder é um grito arrancado pela perda suprema mas o que é saliente nesse grito é a sua convicção de que a vida do filho foi desperdiçada em consequência de um erro de avaliação quase ingénuo: as forças armadas americanas estão no Iraque porque a Administração Bush supõe que pode lá instalar um regime democrático depois de ter aprisionado Sadam Hussein esquecendo que a democracia pressupõe condições vegetativas diferentes.
Paul Schroeder deve saber que, ao contrário da Fé, não há registo histórico que testemunhe a inoculação da Democracia através da ponta das espadas.
O que é estranho é que ele não saiba, ou não desconfie, que George W. Bush e a sua Administração não estejam perfeitamente conscientes desse facto. Mais estranho ainda é que toda a discussão entre o dever estar e o dever sair das tropas americanas do Iraque se esteja a dirimir à volta daquela pretensa ingenuidade. A Bush, por razões politicamente óbvias, depois que se evaporaram os argumentos das armas de destruição maciça, interessa uma razão abnegada por um objectivo heróico, quiçá romântico. Paradoxalmente, uma razão tão desinteressada não é bem aceite pela generalidade da opinião pública mundial, merece grande repúdio na Europa e divide a meio, com tendência para a rejeição, a opinião americana.
Ontem, 5/12, George W. Bush decidiu, num acto quase original e sem precedentes durante os seus mandatos , convocar para uma reunião na Casa Branca treze antigos Secretários de Estado e Secretários da Defesa, um grupo que inclui nomes como Robert McNamara, Frank Carlucci e Madeleine Albright. A reunião terá decorrido de forma civil e aprofundada e o ex-Secretário da Defesa da Administração Carter, Harold Brown, admitiu que a reunião teria como objectivo beneficiar a imagem da actual Administração aos olhos da opinião pública, e, segundo H. Brown teria havido um amplo consenso no sentido de levar as actuais operações de guerra a bom termo.
Com as eleições, a meio do mandato presidencial, para o Congresso e Câmara de Deputados em mira, Bush quer evitar que a guerra no Iraque proporcione vantagens eleitorais aos Democratas e a perda pelos Republicanos da dupla maioria que detêm no Senado e na Câmara dos Representantes. Bush conseguiu esse objectivo na disputa com John Kerry para o mandato em curso e está convencido que os Democratas estão prisioneiros, quanto a este ponto, da inexequibilidade de uma retirada.
É que não estando as tropas americanas a sofrer baixas, quase diárias, no Iraque pela democracia no Médio Oriente, do mesmo modo que não estão, por esse motivo, há largos anos na Arábia Saudita e no Koweit, e onde a preocupação da implantação da democracia alguma vez foi sequer sussurrada, as tropas americanas só podem estar lá por um motivo diferente.
Por não ser politicamente correcto, Bush não dirá nunca que as tropas americanas combatem no Iraque porque aí defendem os interesses vitais dos Estados Unidos, interesses esses que, sobretudo, correspondem à garantia do abastecimento de recursos energéticos indispensáveis. Por tabela, o resto do mundo petróleo-dependente desfruta desta abnegação americana. Hipocritamente, contudo, critica quem abana a árvore e vai enchendo o saco com a fruta que vai caindo ao chão.
Pobre Paul, como é que nunca ninguém te explicou isto?
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